Acheronta  - Revista de Psicoanálisis y Cultura
A beira da brecha
Uma história da Análise Institucional francesa nos anos 60
Heliana de Barros Conde Rodrigues

2° parte

Viene de ...

NANTERRE, LA FOLIE SOCIOLOGIQUE

Em Nanterre,"moderníssimo" campus universitário inaugurado em 1964 nos arredores de uma estação de trem premonitoriamente chamada "La Folie", também os futuros sociólogos prescindem de clientes para aprender sua disciplina. Em 1967, Henri Lefebvre, diretor do Departamento de Sociologia, dirá a seus alunos: "Quando vocês tomam o trem na estação de Saint-Lazare até La Folie,(...) se forem capazes de observar o que vêem da janela, serão verdadeiramente sociólogos."(apud HESS, 1988:232)

Se dependesse dos tecnocratas, Nanterre-La Folie seria um espaço isolado de todas as perturbações da cidade moderna, ou um Hospital Geral apto a limpar tal cidade do eterno risco das desrazões juvenis. Da janela do trem, porém, avistam-se as chaminés das fábricas, os trilhos da estrada de ferro, os canteiros de obras do futuro metrô e, principalmente, uma favela das mais miseráveis de Paris, na qual vivem cerca de 10.000 trabalhadores norte-africanos, e que fora, num passado nada longínquo, um dos bastiões da Frente de Libertação Nacional argelina. A França, que até bem pouco colonizara a África, neo-coloniza, no presente, a periferia de Paris.

Tudo chega a Nanterre, sabe-se lá por que linhas de fuga. Entre 1964 e 1968, forja-se uma lenda sobre ela. À medida que aumentam os estudantes, "internos" à moda dos antigos liceus, vozes se fazem ouvir:"Nanterre, isso é Cuba!". Um jornal chega a fazer dela a Indochina parisiense:"Nanterre é um Vietnã de subúrbio" (RIOUX e BACKMAN, 1968:41). Centrífuga, seus fogos vêm de perto e de longe: favela próxima, regulamentos rígidos, Sudeste Asiático, América latina. À la Bandung, torna-se novo eixo, ao invés de mero satélite de qualquer mãe universitária - leia-se Sorbonne - ou centro político decisório - leiam-se organizações estudantis oficiais.

Em 1967, seus muros se cobrem de cartazes: "Liberdade para Régis Debray!"(17) O não aos guetos imperialistas faz eco à recusa aos guetos sexuais. Em março, um grupo de rapazes invadira o dormitório das moças, desafiando a proibição regulamentar. O diretor da cidade universitária se dirige à Associação dos Residentes, dizendo não aprovar nem desaprovar a presença dos "garçons" junto às "filles", mas, pouco depois, o ato é considerado digno de sanções. A partir de tais episódios, uma Sexpol nanterrense toma corpo, sob os auspícios de W. Reich, cujas idéias contribuem para a redação de um panfleto, distribuído à larga na faculdade e na residência universitária.

"O QUE É O CAOS SEXUAL?.

- é apelar, no leito conjugal, à lei do "dever conjugal".

- é contratar uma relação sexual para a vida inteira sem antes haver conhecido sexualmente sua parceira.(...)

O QUE NÃO É O CAOS SEXUAL?.

- é desejar, por amor recíproco, o abandono sexual sem levar em conta as leis estabelecidas e os preceitos morais, e agir em coerência com isso.(...)

- é não matar a companheira por ciúme.(...)

- é não fazer amor sob os portões (...) como os adolescentes de nossa sociedade, mas desejar fazê-lo em quartos próprios e sem ser perturbado(...).(apud RIOUX e BACKMAN, 1968:44-45)

Com mais de 30 anos de atraso, a juventude francesa descobre o freudo-marxismo e, por esta via, estreitos vínculos entre quotidiano e política. Muito cedo as autoridades educacionais francesas também serão obrigadas a reconhecê-los, mas, antes disso, julgam ter problemas mais importantes a solucionar. Desde abril de 1966, quando assume a pasta da Educação, Alain Pereyfitte está às voltas com uma paradoxal dupla de palavras de ordem - democratização e seleção -, que obsedam o governo De Gaulle.

"Na base era preciso (...) democratizar, e amplamente, o primeiro ciclo do segundo grau. Mas se tratava também de recrutar elites; a democratização devia, portanto, ser acompanhada de uma seleção, para evitar a submersão do bacharelado e das faculdades por estudantes incapazes de seguir(...) estudos tão avançados."(PROST, 1992: 99)

Pierre Grappin &, decano de Nanterre, é considerado um liberal; embora, é claro, um liberal-modernista-gaullista, partidário da seleção à entrada da faculdade. Em novembro de 1967, uma delegação de estudantes a ele se dirige, argumentando ser catastrófica a situação nanterrense: número de alunos muito superior ao planejado; professores insuficientes e bibliotecas inexistentes; trabalhos "práticos" impraticáveis; seleção, não desejada, batendo à porta; nova organização do ensino (18), supondo um problemático estabelecimento de equivalências entre disciplinas; laboratórios falhos ou ausentes, etc. Os estudantes de sociologia do segundo ciclo estão em greve, liderados por católicos e trotskistas da UNEF, pois, embora a entidade estudantil não seja forte na nova faculdade, pega carona nas insatisfações generalizadas.

Grappin não é hostil às reivindicações, mas está acorrentado ao centralismo da reforma. Como prova de boa vontade reúne uma Assembléia Geral, com a presença não só dos professores - conforme reza o regulamento - como dos representantes estudantis. Estes batem na tecla de uma desejada participação permanente nas deliberações. A maior parte dos mestres rejeita tal "exorbitância" e alguns chegam a acusar colegas - principalmente os "perigosos sociólogos" - de haver insuflado a greve. Henri Lefebvre, um dos pretensos culpados, responde à acusação com uma negativa que é um elogio aos grevistas: "Não tive esta honra, monsieur". (apud HAMON e ROTMAN, 1987:390)

O Departamento de Sociologia, principal foco do movimento estudantil, conta, na qualidade de assistentes, com Alain Touraine, Jean Baudrillard e René Lourau. Este prepara, sob a orientação de Lefebvre, uma tese de Doutorado de Estado que virá a ser publicada, em 1969, sob o título A análise Institucional, além de desenvolver alguns grupos de intervenção/análise - prolongamento crítico das experiências de Pedagogia Institucional. Está então bastante ligado aos últimos momentos de Socialismo ou Barbárie, tomando de Castoriadis a temática da dialética instituinte/instituído. Todos os assistentes mantêm estreitos vínculos com os estudantes, dando início a um novo tipo de relação universitária em que o questionamento da instituição formação, ou melhor, da separação entre os que sabem e os que aprendem, se faz presente como prática cotidiana. Na assembléia de 1967, porém, é Lefebvre quem toma a dianteira, defendendo os alunos com tal entusiasmo que, à saída, Touraine comenta com admiração:"O velho leão abriu sua barguilha".(apud HAMON e ROTMAN, 1987:390)

Embora sejam recusadas as propostas radicalmente autonomistas, a Assembléia acolhe diversas reivindicações estudantis: constituição generalizada de grupos de professores e alunos; garantia, no primeiro ciclo, do ensino de ao menos uma língua viva; solicitação de verbas para melhor equipar a faculdade, incluindo bibliotecas. A partir destas propostas, o movimento grevista rapidamente se encerra. Para que possam ser implementadas, Grappin e alguns líderes estudantis se dirigem, em comissão, ao Ministério da Educação, onde são recebidos pelo diretor do ensino superior, que nada lhes oferece ou promete.

Os resultados da greve são vividos pelos estudantes como um grande fracasso. Mesmo os mais moderados são forçados a reconhecer que, embora apoiados por uma ampla mobilização, defrontam-se, nos espaços de poder, com um muro de indiferença modernista. Consumada, assim, a ruptura entre reformistas e revolucionários, os últimos, quase ausentes do movimento grevista, tomam a dianteira. Duvidam que os obstáculos se devam a dificuldades ou problemas políticos passageiros. A reforma do ensino superior e a Guerra do Vietnã, as práticas de seleção e o assassinato de Guevara, os guetos sexuais e a situação de dominação em que se encontram os países do Leste Europeu, tudo converge, a seus olhos, para uma ausência de vida sob o signo do mesmo, na qual o que de melhor se pode esperar é tornar-se pequeno quadro de Estados Mundiais Assassinos. As palavras de ordem, caras aos movimentos de massa tradicionais, cedem lugar às de desordem, parte indispensável do gesto exemplar, tão propalado pelos situacionistas. O ano de 1968 se inicia anunciando:"Após a conciliação, a revolta".(HAMON e ROTMAN, 1967: 391)

O governo gaullista finge tudo ignorar: se não têm pão, que comam bolo! Se não têm biblioteca ou gestão autônoma, que mergulhem na piscina para refrescar corpos e cabeças, perturbados por ideologias nefastas. Além do mais, desde maio de 1967, o Livro Branco da Juventude, publicação oficial do Ministério da Juventude e dos Esportes, pontifica:

"O jovem francês sonha em se casar cedo, mas tem a preocupação de não colocar filhos no mundo antes de dispor de meios para educá-los corretamente (...). Interessa-se por todos os grandes problemas do momento, mas não pretende entrar tão cedo na vida política (...) Não crê numa guerra próxima e pensa que o futuro dependerá, sobretudo, da eficácia industrial, da ordem interna, da coesão da população".(apud HAMON e ROTMAN, 1987: 401)

Em janeiro de 1968, é exatamente François Missoffe, autor destas pérolas positivistas, quem visita Nanterre para inaugurar a piscina olímpica ofertada a esses jovens que encarariam a vida com tanto atletismo. Ninguém ignora que a visita é perigosa, pois, após o fracasso da greve, os estudantes mais radicais - os enragés - se tinham feito mestres do desafio, infernizando a vida até mesmo - ou principalmente - dos professores mais afeitos ao diálogo.

Prepara-se, contudo, uma surpresa. Logo que chega, o ministro se depara com cartazes que marcam um encontro na piscina, indicando o itinerário através de enormes falos usados à guisa de setas. Quando Missoffe atinge o destino, Daniel Cohn-Bendit dele se aproxima. O decano Grappin, assustado, o puxa de volta e Danny se deixa conduzir sem resistência, mas logo retorna pelo lado oposto, pedindo ao representante do governo que lhe acenda o cigarro. Depois de algumas baforadas, o diálogo devém situação. O estudante diz haver lido o Livro Branco, tendo estranhado não encontrar, ao longo de trezentas páginas, uma palavra sequer sobre os problemas sexuais dos jovens. Missoffe tenta sair pela tangente, alegando estar sua presença voltada unicamente para os esportes, porém Danny volta à carga. Ante tal desafio à autoridade, o ministro cai na armadilha e a conversa se torna um espetáculo raro.

Missoffe:" - Com a cabeça que você tem, deve conhecer certamente problemas desta ordem. Eu só poderia lhe aconselhar um mergulho na piscina."

Danny:" - Eis uma resposta digna das juventudes hitleristas".(apud HAMON e ROTMAN, 1987:401)

Com esta réplica, Daniel Cohn-Bendit se transforma em "Danny-le-rouge", o perturbador de cabelos vermelhos. Nada de acordos ou manifestos: a interpelação direta é a nova arma política, na forma de ações exemplares, para as quais não faltam oportunidades. Poucas semanas depois, em meio a boatos sobre a expulsão de estudantes, os enragés voltam a inovar: fotografam presumidos "dedos-duros" e passeiam pela faculdade com faixas onde estão pendurados os retratos. Aproveitam para chamar fotógrafos profissionais, a fim de que a cena seja imortalizada. O "liberal" Grappin chama a polícia, mas esta é obrigada a bater em retirada em busca de reforços. Quando retorna, é recebida por um grupo multiplicado por dez, cuja máquina-de-guerra conta, agora, com pedaços de mesas e cadeiras para fazer recuar os repressores. Os enragés contaminam Nanterre com suas novas táticas, imprevisíveis e vitoriosas.

Danny é "rouge" em cabelos, "noir-et-rouge"(19) em referência política. Estas cores, mescladas, percorrem o planeta, visíveis que são em todas as universidades do "velho" e "novo" mundos. O ano de 1968 tem início com inumeráveis movimentos, à maneira das guerrilhas múltiplas em torno da bem-sucedida Ofensiva do Tet, na qual os vietnamitas provam que o "invencível" exército americano não faz jus ao adjetivo. De Berkeley a Berlim Ocidental, de Turim a Tóquio, a juventude evoca os nomes e táticas do Che e de Ho-Chi-Min em uma multiplicidade de ações diretas contra todos os colonialismos, internos e externos, em uma Bandung generalizada.

Muito depressa o idioma polonês se vem juntar a esta Babel Internacional onde, paradoxalmente, todos se entendem. No início de março, os estudantes franceses estão frente à Embaixada da Polônia portando faixas e gritos: "Democracia Socialista!"; "Liberdade para Kuron e Modzelewski!". Estes últimos, professores assistentes na Universidade de Varsóvia, haviam divulgado, há cerca de três anos, uma "Carta Aberta ao Partido Operário Polonês"(20) que lhes valera três anos de prisão. À mesma prisão estão agora de volta, a partir de um caso que poderia ser dito cômico, não fosse ele mais uma daquelas circunstâncias a sugerir que as grandes dominações talvez não sejam senão a orquestração de pequenos exercícios de poder.

O caso pode ser resumido em alguns atos, nos quais a boa lógica da divisão passado-presente-futuro é objeto de uma assistemática desconstrução. Desde janeiro de 1968, o Teatro Nacional de Varsóvia exibe uma peça de Mickiewicz *, intitulada Os Antepassados, focalizando a resistência polonesa contra o Império Czarista. Sabe-se lá por que estranhas associações, o público passa a aplaudir, em cena aberta, certas falas - "Não quero a liberdade que Moscou me oferece!", "Moscou sempre nos enviou canalhas!". Diante de um desafio de tal monta à ordem (teatral?), após poucas semanas de apresentação o Ministro da Cultura interdita o espetáculo, alegando "aplausos demasiado demonstrativos". O responsável pela cultura parece ater-se aos fatos, mas oportunas interpretações não tardam. Depois que vários escritores denunciam censura e os estudantes de Varsóvia ocupam a Universidade clamando por democracia, há que encontrar os diretores certos: os "antepassados" só podem ser Kuron e Modzelewski que, desde o início dos anos 60, insistem em associar socialismo e liberdade.

A temporada, no entanto, não se encerra aí. Caminhando de universidade em universidade, os protestos chegam à frente do Comitê Central do Partido Operário Polonês, promovendo novo agenciamento entre nações. Os manifestantes devêm tchecos, proclamando:"Toda a Polônia aguarda o seu Dubcek"(21).(HAMON e ROTMAN, 1987:422) Temendo que o movimento se amplie, o governo recorre a discursos de ocasião, associados a míticas categorias de acusação: por um lado, os líderes são acusados de membros daquela "juventude dourada" que, em todo o mundo, incomoda todo mundo (que parte deste mundo seja capitalista não perturba esta lógica de coexistência pacífica); por outro, são suspeitos de estar sendo manipulados...por um "complô sionista"!

A sombra do antigo Kominform (22) cai sobre a Polônia via encenação de um passado erroneamente julgado ultrapassado. Em Katovice, importante centro industrial, o Partido dirige uma manifestação "espontânea" de operários, cujas falas espalham terror em vez de aplausos:"Os estudantes a seus estudos!";"Os sionistas a Moshe Dayan!"(23)

Os poloneses parecem dotados de um incomum bom humor negro, conforme revela um dito espirituoso da época: "Meu pai é escritor, meu marido é judeu, meu filho é estudante. Estou numa situação desesperadora." A anedota tem pressa: mais de mil estudantes são presos sob uma ("dourado"), outra ("sionista") ou ambas as acusações - síntese que mantém no cárcere mais de duzentos. Em Paris somos, senão todos, muitos judeus poloneses. À frente da embaixada, a Internacional Estudantil grita: "Roma, Berlim, Varsóvia, Paris!", em ritmo de "hop-hop" japonês. Nos momentos de descanso, corre nova piada importada de Varsóvia:

"- Sabe qual a polícia mais culta do mundo?.

- Não tenho idéia.

- É a polícia polonesa.

- Certo, mas por que?.

- Porque todos os dias ela vai à Universidade".(HAMON e ROTMAN, 1987: 420)

Estamos em março de 1968. Falta pouco para que, no dia 22 do mesmo mês (24), comece o maio francês, paradoxo dos devires que contrariam calendários. Nesta data, após a prisão de seis estudantes acusados, sem qualquer prova, de explosões em frente às sedes do American Espress, TWA e Bank of America, cento e quarenta e dois enragés nanterrenses ocupam a Sala do Conselho da torre de administração. Bem depressa a polícia francesa se tornará mais culta e o mundo partilhará, por alguns meses, do paradigma do sonho como ser.

SEM BASTILHA OU PALÁCIO DE INVERNO

O maio: na França, nome-monumento condensador de séries, que uma superficial cronologia situa entre o 22 de março e o final de junho de 68 - momento em que uma Paris "completamente limpa" é "devolvida aos turistas"(TURKLE, 1983: 11). O maio: algo muito além da França, caro a todos os mundos, sob uma infinidade de causas e bandeiras(25). O maio: incerteza a ser reduzida, monumento a ser tornado mero documento por uma tradição que ele incomoda e desafia.

Em artigo recente, publicado exatamente em uma das comemorações do aniversário de 68, Cardoso nos convida a problematizar esta forma de memória coletiva:

"Os intervalos regulares de tempo das comemorações constituem-se em tempo cronológico, homogêneo, que ofusca as temporalidades históricas que circunscrevem cada um dos tempos presentes a que estão referidas as datações da série. Este mesmo movimento regular ritualiza o ato de comemorar, no sentido de uma ação repetitiva que obscurece os sentidos históricos presentes que estão na base de cada ação comemorativa".(CARDOSO, 1998:1-2)

Como antídoto a tal situação , Matos, no mesmo periódico, nos incita a inventar formas singulares de memória: "Comemorar significa: dar vida, nascer de novo em cada aniversário, sendo ocasião para reinterpretar os acontecimentos. Compreendê-los sem ceder à facilidade de explicações definitivas, pois toda revolução ancora-se no contingente".(MATOS, 1998:17)

Por esta problemática - a das comemorações/rememorações de 68 - começaremos nossa exposição, tomando por base uma de suas revisões, apresentada em Pensamento 68: ensaio sobre o anti-humanismo contemporâneo, livro dos neo-kantianos Luc Ferry & e Alain Renaut &. Os autores se dispõem a tecer um fio condutor para distribuir diferentes versões do maio, segundo o que denominam "condições de possibilidade". São apresentadas três grandes categorias de leitura: (a) aquelas nas quais o intérprete esposa o ponto de vista dos atores; (b) aquelas em que o intérprete julga ilusório ou mistificador o ponto de vista dos atores; (c) aquelas nas quais maio de 68, entendido como irrupção radical de novidade, é dito irredutível a versões interpretativas.(FERRY e RENAULT, 1988: 62-63)

Bem pouco kantiana, não vejo nesta classificação "condições de possibilidade" para conhecer o maio francês, mas a auto-instauração de "condições de existência" para a démarche teórica de Ferry e Renault, voltada à crítica do que chamam "pensamento 68" - Althusser, Lacan, Foucault, Derrida, Bourdieu, ou seja, o "estruturalismo". Mesmo tendo em conta esta observação, o esquema proposto permanece provocativo. Segundo seus autores, na primeira categoria se situariam as interpretações de Sartre, Castoriadis e Morin. Os três seriam sujeitos-analistas a compartilhar o ponto de vista dos sujeitos (práticos) das ações, percebidas como "revolta da liberdade contra a opressão do Estado"(idem:64). Na segunda categoria se localizariam as leituras de Régis Debray e Gilles Lipovetsky, respectivamente marxista e tocquevilleana, que identificam no maio "uma etapa no desenvolvimento do individualismo burguês"(idem: 67): os atores de 68 seriam agentes inconscientes de um processo histórico que os engloba e ultrapassa - desenvolvimento das forças produtivas, no primeiro caso; reforço crescente da legitimidade democrática, no segundo. Nesta linha de raciocínio, os atores teriam feito história, mas, sobretudo, "sem saber a história que faziam"(idem:73).

Na última categoria, Ferry e Renault incluem a perspectiva de Claude Lefort, para quem maio de 68 é um acontecimento, um "sem por quê".

"(...) todos procuram dar-lhe um nome, todos tentam referi-lo a algo conhecido, todos procuram prever suas conseqüências. Arquitetam-se à pressa interpretações, pretender-se-ia o restabelecimento da ordem, senão nas factos, pelo menos em pensamento (...) Quereríamos colmatar a brecha no lugar onde nos encontramos. Em vão (...).(LEFORT, 1969: 41)

Aqui o maio-brecha é enigma, e assim deve permanecer. O fato de que não vise a substituir o poder combatido por outro melhor é justamente o que o delimita como acontecimento singular. Para Lefort, a ilusão teleológica da "boa sociedade" - libertação, reconciliação - é parte da vontade (totalitária) de sistema. A ação revolucionária, a seu ver, não obedece a planos preestabelecidos, consistindo, ao contrário, em "alterar os planos", "estimular as iniciativas coletivas", "abater os tabiques", "fazer circular as coisas, as idéias e os homens"(idem: 75).

Para quem prossegue a leitura do livro de Ferry e Renaut, é fácil esclarecer o que Lefort chama "vontade de sistema". Auto-proclamados analistas de 68, os dois não admitem inquietudes. Apressam-se em reduzir o matizado pensamento do ex-sociobárbaro a vulgar variante da fenomenologia para, em seguida, encarcerá-lo na repisada oposição entre explicação e compreensão: o Lefort de Ferry e Renaut tudo compreenderia sem nada explicar da singularidade do maio. Acrescentaríamos nós, fundando-nos na estratégia dos autores: "como queríamos demonstrar".

Neste sentido, para maio de 68, em lugar da abordagem totalizante, preferimos a fragmentação explosiva, sem garantias de qualquer espécie, estejam elas no ponto de vista dos atores absolutos ou de um único Ator Absoluto (História com maiúsculas). Privilegiamos, assim, o efeito maio frente às causas do maio, remetendo, através da primeira expressão, à possibilidade de se deixar afetar pelos acontecimentos, de fazer-se permeável à sua violenta heterogênese. Daí julgarmos risíveis, se não fossem tão mortíferas, as tentativas de encontrar, para 68, o livro, o paradigma ou a ideologia.

O livro de 68? Seria ele de Marcuse, de Sartre ou dos situacionistas, como alternativamente se tentou fazer crer? Mas...como assim, se esta multidão que ocupa ruas, universidades, rádios, teatros e fábricas, e quer mesmo incendiar a bolsa de valores, não fala em nome de ninguém e não deixa que ninguém fale em seu nome?

"Queriam apresentar Marcuse como o mestre de nosso pensamento: isso é uma piada. Ninguém no nosso meio jamais leu Marcuse. Sem dúvida, alguns lêem Marx, talvez Bakunin e, entre os autores contemporâneos, Althusser, Mao, Guevara, Lefebvre. Os militantes do 22 de março quase todos leram Sartre. Mas não se pode dizer que qualquer autor tenha sido o inspirador do movimento"(COHN-BENDIT et al., 1968: 57).

Não se trata tanto, aliás, do que tenha, ou não tenha sido lido, por quem ou por quantos. Trata-se de indagar se não é a (des)organização do maio que torna visíveis as palavras sábias dos mestres. Parodiando o jovem Felix Guattari, "não é o mesmo livro, em qualquer movimento, que me fará empreender uma Grande Recusa".

Não havendo livro, haverá paradigma? Sujeito ou estrutura? Humanismo ou anti-humanismo? Os mais simplistas vêem no maio a "ressurreição do homem", considerado prematuramente morto pelo estruturalismo. Não é fácil, entretanto, sustentar vínculo tão claro entre maio e sujeito, à vista de slogans tais como "Somos todos judeus alemães" (desafiando o governo, que considera indesejável o "estrangeiro" Cohn-Bendit) ou "Somos um grupúsculo" (respondendo às investidas da esquerda oficial, que menospreza o caráter minoritário do movimento)(26).

No que tange ao debate estruturalismo versus filosofia do sujeito, mais vale contar histórias. Em muitas publicações, a presumida "vingança do homem" desponta sintetizada na frase "as estruturas não descem às ruas"(27). Consideramos bastante problemático analisar frases sem levar em conta as circunstâncias em que são formuladas, os jogos de forças em meio aos quais são afirmações perspectivas. Segundo o relato de Louis-Jean Calvet &, certo dia, durante os meses a que se chama maio, Catherine Backès-Clement chega de uma Assembléia Geral de Filosofia e lê uma longa moção que se encerra com a referida locução. Ela é escrita no quadro-negro e amplamente comentada diante de A. J. Greimas, cujo seminário fora transformado em "comitê de ação"(28). No dia seguinte, Greimas encontra um cartaz colado na porta, anunciando: "Barthes diz: as estruturas não descem às ruas. Nós dizemos: basta de Barthes"(CALVET, 1990:204). Barthes não estivera presente quando do aparecimento da frase e pouca coerência haveria em a ter porventura inventado.

O que aqui está em questão é menos o tipo de paradigma dos mestres do que a eventualidade destes desejarem impor o domínio de qualquer paradigma-tipo. Pouco importa se as estruturas descem, ou não, às ruas, mas importa muito o que quer na vontade (29) que formula tais máximas: naturalizar a divisão entre os que sabem e os que aprendem, ou pô-la em análise e movimento?; restringir a vida aos limites ditados por alguma instância pré-legitimada, ou expandi-la ao infinito? A nosso ver, nos discursos/práticas/subjetivações do maio habita mais uma rejeição ao primeiro termo destas indagações do que ao estruturalismo em geral (ou a Barthes, em particular).

Não sendo a questão nem livro nem paradigma, poderíamos respondê-la via ideologia? Os que assim pensam ainda mais tinta gastaram que os anteriores, defrontados com um acontecimento que não se coaduna com a "história dos historiadores", cujas perguntas invariavelmente são: quem fez?; por que?; para que?; sob que ideário? Como escrever a história de um algo em que estudantes (?) - pois houve professores, operários, artistas, religiosos, profissionais liberais, radialistas - se revoltam contra tudo - mediante ações específicas a cada caso -, sem que O Poder - enquanto poder de Estado (Bastilha, Palácio de Inverno) - seja alvo prioritariamente visado?

As dificuldades da empreitada levaram muitos analistas a aparentar o maio a uma revolução ideológica, ou seja, a identificar seu significado fundamental em um ideário, código, cultura ou ethos subjacente.Embora as atribuições sejam variadas - "romântico", "materialista", "desejante", "psicologista", "individualista", etc.-, existe uma base comum: quase todos concordam em fazer do movimento a glorificação de uma "espontaneidade natural" que viria à luz desde que eliminados os constrangimentos sociais ("repressivos") que teriam mantido a primeira, até então, muda e inerte. Tratar-se-ia de uma espécie de "ideologia do bom selvagem", passível de receber roupagens freudianas, reichianas, marcuseanas, jovem-marxistas ou anarquistas, sempre apontando, todavia, na direção de uma natureza separada do e enfrentada ao social ou cultural.

Estas formas de análise costumam recorrer ora ao texto escrito - os presumidos livros do maio - ora, e com maior freqüência, aos slogans ou graffittis. Um deles detém a preferência absoluta: "Sous le pavé, la plage" (sob o calçamento, a praia), às vezes sob a variante "sous le pavé, le sable" (sob o calçamento, a areia). Volta à cena, aqui, uma análise de discurso conteudística, que abandona completamente o campo das circunstâncias em que a fala é proferida. De nossa parte, preferimos praticar uma análise estratégica de discurso, de inspiração foucaultiana, para a qual os documentos discursivos - sejam eles livros e decretos, ou graffittis e slogans - ajudam a decifrar as relações de poder, de dominação e de luta no interior das quais se estabelecem e funcionam. Para tanto, é necessário captar tanto seu poder de perturbação próprio quanto o conjunto de táticas com as quais se tenta encobri-lo, inseri-lo e classificá-lo para enfraquecer, exatamente, tal poder de perturbação. Nesta perspectiva, "sob o calçamento, a praia" (ou a areia) não é necessariamente a ideologia extrativista de uma natureza subjacente. Quando analisamos estas palavras em relação com os acontecimentos em que sua força se manifesta, há aspectos não discursivos que com elas se compõem, engendrando outra leitura: afinal de contas, só há praia (ou areia) debaixo dos pavés porque estes são atirados nos chefetes de todos(as) os(as) uniformes/uniformidades, ou empilhados, à guisa de barricadas, em dias (e noites) de recusa a que se nos ensine como devemos pensar, agir ou ser. Quanto à leitura da ideologia do maio, portanto, "sejamos realistas: tentemos o impossível!".

Abandonados o livro, o paradigma e a ideologia grandiosos, retornemos ao banal. No prefácio a L'illusion pédagogigue, Georges Lapassade narra o que considera um acontecimento-analisador (30). Recorda que a 22 de março de 1968, em Nanterre, René Lourau participa de uma sessão do Grupo de Análise Institucional. Está acompanhado de outro professor e de alguns alunos do primeiro ano. Os demais - tanto os freqüentadores habituais quanto os não regulares, como Daniel Cohn-Bendit - estão ausentes, ocupados em ocupar a Sala do Conselho. Lapassade é intrinsecamente analítico ao relatar a seqüência do processo.

"Na semana que se segue, Lourau decide interromper definitivamente (...)"seu" grupo de análise institucional. Mas em 22 de março, ao fim da noite, não estava longe de interpretar a ausência de Danny e seus amigos em termos de "resistência à análise"(...) Não sei qual teria sido minha escolha se eu estivesse em Nanterre na noite do 22 de março. Eu teria, sem dúvida, hesitado entre a análise e a tentação de participar da ocupação..."(LAPASSADE, 1969: 9).

Tanto na seqüência deste prefácio quanto no novo prólogo que redigirá, em 1974 para Grupos, organizações e instituições, Lapassade se dedica a debater eventuais vínculos entre as práticas analítico-institucionais nos campos da pedagogia (e da formação sindical) e a ação sobre o terreno levada a efeito pelo "22 de março". No caso deste último, até mesmo a denominação deixa de apelar, como é costumeiro, para algum ismo (teórica ou politicamente instituído), optando pela referência à ação histórica datada. Próximos dos situacionistas, pejorativamente apelidados anarquistas ou anarco-comunistas, os 142 nanterrenses da primeira hora muito cedo entrarão em contágio com inúmeros grupos políticos, sindicais ou simplesmente libertários. Neste percurso, onde política, sociológica ou psicossociologicamente ninguém está em completo "acordo ideológico" com ninguém, somente a ação é ligadura. Sendo assim, além dos 142 iniciais, serão "membros" do 22 de março todos aqueles que aceitem desenvolver iniciativas em comum. De uma centena e meia a uma cifra incalculável de aliados se compõe este desafio às formas centralistas de organização, sejam elas políticas, teóricas, sindicais ou pedagógicas.

O (ex) psicossociólogo Lapassade parece feliz em ser assim ultrapassado:

"...alguns entre nós pensavam que era possível transformar radicalmente a educação, a classe, a universidade, e talvez mesmo o Estado pela introdução "subversiva" de novas instituições no grupo-classe, isso à luz das tentativas paralelas dos "psiquiatras institucionalistas"(...) A crise de maio dissipou as ilusões e os mal-entendidos (...) Essa crítica (...) por meio de ações diretas, por meio de atos (...) é infinitamente mais profunda, mais significativa do que a que se faz, habitualmente, da burocratização dos estabelecimentos e dos aparelhos"(LAPASSADE, 1977:23-25).

Lourau hesita, mas logo dissolve "seu" GAI (31) (Grupo de Análise Institucional) de Nanterre. Lapassade carrega pianos para o pátio da Sorbonne - afinal, trata-se de uma festa - e promove agitação nos comitês de ação instalados nas escadas da Universidade. Lefebvre, junto com Ricoeur e Touraine, defende Danny e outros enragés frente ao Comitê de Disciplina de Nanterre. Felix Guattari reúne-se na sede da FGERI com alguns noir et rouge - Daniel Cohn-Bendit &, Julian Beck &, Jean-Luc Godard -, dando partida à ocupação do teatro Odéon. Os especialismos se rompem pelo "efeito-maio", é o que nos dizem alguns - os que se deixam "molhar"(32) nas águas do acontecimento.

De forma análoga a Lapassade, Guattari sintetizará, mais tarde, o sentido do adjetivo analítico aplicado ao 22 de março:

"Não se reduz ao fato de que as pessoas falem para fazer a crítica das ideologias (...) ou que reivindiquem (...) mais liberdade, mais criatividade (...). O "22 de março" existia em Nanterre sobre o pano de fundo de um certo urbanismo, de um certo tipo de sistema social, de uma concepção particular da relação com o saber (...). O agenciamento analítico aqui, portanto, não só concerne a indivíduos, grupos, locutores reconhecidos, como também aos mais diversos componentes sócio-econômicos, tecnológicos, ambientais, etc..."(GUATTARI, 1981:103).

O que entusiasma aqueles que ora estamos justificados em chamar, com armas distintas da tradição acadêmica, novos analistas, institucionalistas ou analistas institucionais - defensores da análise coletiva tornada ato, com todos os meios disponíveis (discursivos, técnicos, sonoros, gráficos, urbanos, etc.) - é exatamente a mesma coisa que incomoda profetas do sucesso e arautos do fracasso. Porque estes sempre falam em nome de algum dos ismos disponíveis...

Os profetas nem esperaram que o maio findasse para reivindicar monopólios de sapiência premonitória. Em 1980, através de L'auto-dissolution des avant-gardes, René Lourau - redimido das antigas oscilações (psic)analíticas - pôs em tela de juízo a pretensão de quatro vanguardas - surrealismo, letrismo, situacionismo e anarquismo - de haverem encontrado, em maio de 1968, "uma validação por vezes parcial, por vezes total, de suas "hipóteses" sobre a revolução"(LOURAU, 1980:17).

Surrealismo e Letrismo, embora se reconheçam no movimento - por sua espontaneidade, humor e poética irracionalidade -, não ousam reivindicar paternidade. Serão os "situs", dissidência do letrismo, que chegarão a se auto-designar como os anunciadores da Grande Recusa. Um livro de R. Viennet, intitulado Enragés et situationnistes dans le mouvement des occupations, atinge, neste sentido, o triunfalismo explícito.

"Os situacionistas (...) tinham há vários anos previsto exatamente a explosão atual (...). A teoria radical foi confirmada. (...) O movimento das ocupações tirou o sono de todos os mestres da mercadoria e nunca mais a sociedade do espetáculo poderá dormir de novo"(apud LOURAU, 1980:22).

Também J.-F. Lyotard menciona semelhanças entre a problemática do 22 de março e a da Internacional Situacionista: ambos criticam a representação, isto é, a relação de exterioridade estabelecida entre a atividade e seus produtos, em todos os âmbitos. Neste sentido, é a vida que se apresenta alienada como um todo, e não apenas as relações entre sociedade civil e Estado, massas e Vanguarda Revolucionária, ação criadora e Planejamento Técnico. Mas o próprio Lyotard apressa-se em destacar a originalidade do 22 de março: a seu ver, este movimento-relé estende a crítica dos "situs" à esfera de uma política em ato (LYOTARD, 1975:301). René Lourau é ainda mais reticente quanto às veleidades proféticas dos situacionistas: apontem elas para um triunfo ou um fracasso do maio, a posição d'avant-garde assim assumida acaba por se constituir em novo espetáculo social (ou estatal) para consumo de espectadores imobilizados diante de uma tela de registro monopolizadora.

Sob objeções análogas caem, aos olhos de Lourau, as pretensões anarquistas de profecia ou balanço, mesmo havendo sido 1968, segundo a imprensa oficial, "anarquista" ou "anarco-surrealista". Poucas semanas depois da "devolução de Paris aos turistas", os membros da Federação Anarquista realizam um Congresso Internacional, onde brandem os nomes de Proudhon *, Bakunin *, Kropotkin * e Stirner * enquanto "verdadeiros autores" da revolução de maio. Segundo Lourau, por mais que citem Bakunin, os "anars" permanecem amnésicos quanto a um de seus princípios: se a organização deseja preparar a revolução, deve revolucionar a si mesma, passando a funcionar da forma mais autogestionária possível. Não é o caso dos anarquistas em questão: preferem a forma política tradicional do "Congresso", a glória aos mestres, os "autores" centralizados (e centralizadores).

Expulsos os falsos profetas, Lourau passa à análise do modo de ação do "22 de março", destacando um conjunto de características: (a) o movimento não possui uma história que se "realizaria" em 1968; é, ao contrário, criado pela ação; (b) é o único dos grupúsculos de 1968 que se auto-dissolve em 1968, depois de haver "fusionado" inúmeras militâncias tradicionais (UNEF, trotskistas, marxistas de oposição, anarquistas, anarco-situs, etc.); (c) funciona praticando auto-análise permanente, ao invés de se propor como "origem-e-fim" por intermédio dos conhecidos dispositivos das afiliações, reuniões regulares e contribuições financeiras; (d) não pretende substituir o titular do poder por um partido revolucionário, mas criar focos múltiplos de poder, privando, assim, o presumido centro de sua unificação dominadora; (e) funciona através de "ações exemplares", isto é, atos que transformam as relações de poder em casos concretos e pontos precisos(33); (f) altera o significado do termo "revolução", tornando finalidade aquilo que, no sentido ortodoxo, constituía simples meio: fusão de grupos, multiplicação de encontros, instituição de assembléias pelo e dentro do exercício de resistência ao poder; (g) pretende que as lutas tenham caráter transversal, atingindo setores não só estudantis como pertencentes ao mundo do trabalho, especialmente operário; (h) não possui, em contraste com as organizações revolucionárias tradicionais, progama, planificação ou projeto a médio e longo prazos, restringindo-se à análise e intervenção em um presente de curta duração; (i) acata a coordenação entre espaços de ação, mas não considera que uma organização unificada seja imprescindível antes que a própria situação o exija.

Desmistificadas as profecias, exposto o funcionamento, cabe ao 22 de março a denominação "movimento". Muito lefebvreanamente, Lourau o qualifica de "quotidianista": síntese sempre renovada entre inventividade estética e crítica política das formas de viver cristalizadas. Já Guattari, autor tantas vezes acusado de ‘difícil", à vista de tantas conexões e afecções, considera que, se nome há que fornecer, é um quase-sinônimo: agenciamento coletivo de enunciação. Tanto um quanto outro falam igualmente em movimento de autogestão, compreendendo-se o termo como democracia direta e prática permanente da crítica e da análise. Tantos belos nomes, saídos de um "deixar-se molhar" pelo maio, interessam-nos menos por sua ressonância do que enquanto armas discursivas a contrapor, se não mais aos profetas - já suficientemente apedrejados -, decerto aos sorridentes arautos do fracasso.

Sim, porque para quase todo mundo, maio de 68 "fracassou". Renunciamos a opor um pretenso "sucesso" a tal alegação: não o podendo defender sem cair nas armadilhas políticas montadas pelos adversários, preferimos abordar alguns elementos da construção do alegado "fracasso". A esquerda oficial dele participou tanto durante os acontecimentos como recorrendo a interpretações retrospectivas. Raros foram os momentos históricos em que o discurso do comunismo partidário foi tão fortemente obscurantista, ou melhor, quiçá nunca tenha sido tão necessário aos comunistas franceses declarar "não revolucionário" o caráter de uma situação. O PCF não está sozinho nesta campanha em prol do fracasso, pois a CGT, seu braço sindical, se porta igualmente bem. É claro que, em certos momentos, a surpresa em face do desencadeamento de greves e ocupações de fábrica chega a perturbar, com o ritmo da festa, a seriedade que deve caracterizar uma vanguarda sindical competente. Em 13 de maio, por exemplo, Danny (22 de março) e Sauvegeot (UNEF) desfilam por Paris ao lado de Georges Séguy & (secretário geral da CGT), em uma manifestação operário-estudantil que reúne mais de um milhão de pessoas. A ação exemplar ganha adeptos no dia seguinte: os operários da Sud-Aviation de Nantes seqüestram o diretor e tomam a fábrica. Uma semana depois já são cerca de dez milhões de grevistas em toda a França.

Com a mesma rapidez com que se espalha, a "peste" deve ser contida. Uma semana a mais e as manifestações da classe operária são recodificadas como "reivindicatórias" por "seu" partido e "seu" sindicato. Apesar dos tímidos protestos da CFDT - central sindical simpática aos projetos autogestionários -, Séguy se esquece do 13 de maio em troca das vantagens econômicas pretensamente presentes em um grande pacto com as forças da ordem, denominado "Acordos de Grenelle". A partir do dia 24, a CGT passa a enviar apelos às fábricas de todo país para que as greves sejam suspensas e, no dia 27, Grenelle é firmado.

Nada mais justo que classe tão reivindicativa retornasse imediatamente à bela vida normal. O maio, no entanto, é pleno de surpresas e a rejeição ao "vantajoso acordo" se faz sensível. Eleições marcadas para breve, perigo de fracasso à vista. Neste quadro, PCF e CGT tudo fazem para conter estas "utopias", estes "aventureirismos", que só podem provir do "estrangeiro": estas bandeiras negras, aquela juventude dourada, este "boche", aquele outro... "judeu"? Apenas a boa imagem a preservar no espetáculo da política parlamentar parece impedir a esquerda oficial de unir-se à multidão que desfila pelos Champs-Elysées a 30 de maio, em apoio ao governo.

Poucos focos resistem a esta entusiasta construção do fracasso: somente a Renault de Billancourt e de Flins, a Peugeot e o Centro de Correios e Telégrafos permanecem ocupados. Contra a poesia dos graffittis, a CGT usa a linguagem dos processos de Moscou, em um panfleto intitulado Derrotemos os provocadores:

"O poder gaullista procura e provoca a desordem. Encontra neste domínio uma ajuda importante entre os grupos esquerdistas, trotskistas, maoístas, anarquistas. Em toda a parte onde a greve permitiu aos trabalhadores obter satisfações importantes, intervêm contra a vontade dos trabalhadores para impedir a retomada do trabalho de uma maneira normal" (apud MATOS, 1981:78)

Que "satisfações importantes" são essas? É claro que os salários passam de 2,27 a 3 francos a hora, mas os 3,46 previstos para outubro são postergados para entendimentos futuros, o mesmo ocorrendo com relação à aposentadoria por idade e à aplicação do salário mínimo na agricultura e territórios de ultramar. As tão sonhadas 40 horas semanais dependem de cálculos complicados, demandando a aplicação de redutores progressivos. Provavelmente mais bem aparelhada de matemáticos que a CGT, a CFDT calcula que em alguns setores, como as estradas de ferro, as 40 horas serão alcançadas...no ano de 2008! Apesar disso, a CGT prossegue em sua cantilena, falando de "vitória" e dos perigos de "tentar o impossível". Alguns resistirão, haverá alguns mortos e feridos, mas a eficácia sindical sairá inabalada. Um dia, em outro contexto, J.-F. Lyotard alcançará, no discurso, a síntese genial desta trama:

"Não há eficácia revolucionária, porque a eficácia é um conceito e uma prática contra-revolucionária em seu princípio mesmo. Há uma percepção e uma produção de palavras, práticas, formas, que podem ser revolucionárias sem garantia se são bastante sensíveis (...) para deslocar todos os dispositivos possíveis e mudar a própria noção de operatividade"(LYOTARD, 1975a:16).

O PCF e a CGT não toleram a falta de garantias. São especialmente dotados daquilo que o filósofo Herbert Marcuse denomina"espírito de seriedade": o que está do lado da ordem social, da racionalidade tecnocrática, da cultura universitária; o que está contra o desconhecido, o aleatório, o jogo, a aventura. Uma convocatória de direita, distribuída à época, exibe igualmente tal espírito, em todas as suas letras:

"Basta! Não queremos mais: milhares de bandeiras vermelhas sobre os monumentos públicos,(...) nas manifestações, nos anfiteatros; a Internacional cantada de punho erguido pelos manifestantes; a bandeira francesa profanada, rasgada, queimada nas praças públicas, transformada em farrapos ignóbeis; o túmulo do soldado desconhecido manchado; a anarquia que se instala na Universidade transformada em cloaca,(...) as greves rotativas, o Odéon transformado em depósito, os afrescos da Sorbonne recobertos por inscrições. Por mais Leis, mais autoridade!"(MATOS, 1981:83).

É rápido o restabelecimento da ordem, desejada por esquerda e direita oficiais. Cada vez mais estas lateralidades parecem trasmutáveis, bastando, para tanto, virar-se de frente ou de costas para um mapa-mundi que tantos querem, há tanto tempo, homogeneizado e integrado. Junho é o mês da dissolução, pelo governo, dos grupúsculos que, há pouco, todos éramos. O 22 de março não espera pela Lei, acostumado que está a construir as suas: o grupo se auto-dissolve. Junho é também o mês em que Sorbonne e fábricas ocupadas capitulam. No último dia, as eleições dão ao gaullismo maioria absoluta na Assembléia Legislativa. No princípio de agosto se ouve, pelo rádio, uma canção digna desta restauração, intitulada O Oportunista.

"Moi jamais je ne conteste/ Ne revendique, ni ne proteste/Je ne sais faire qu'un seule geste/Je retourne ma veste/Toujours du bon côté".(RIOUX e BACKMAN, 1968:593)

Direito e avesso vestem a mesma casaca, sugere o compositor. Ninguém duvida disto no momento em que as forças do Pacto de Varsóvia, ainda em agosto, esmagam as recém-brotadas flores da Primavera de Praga. Adepta do bom humor negro do Leste, a ordem restaurada oferece ao jovem Dubcek o trabalho...de jardineiro público! Igualmente bem humorado, o PCF manifesta sua surpresa (e reprovação!) quanto à intervenção. De Gaulle toma atitude idêntica: a liberdade dos outros é sempre mais bela que a nossa. Aliás, não se deve ser irônico com a história, mas ela, com suas minúsculas, por si só inventa ironias: Svoboda, o nome do presidente tcheco encarregado de conter eventuais revoltas em face da invasão soviética, significa precisamente liberdade. Esta liberdade foi desejada em demasia - vociferam analistas sábios de todo o planeta. Que na Plaza de las Tres Culturas mexicana, no mês de outubro, mais de trezentas pessoas sejam mortas a gritar por ela, para estes especialistas do assassinato da vida é apenas uma prova a mais para suas teorias.

Em meio aos que triunfam com o fracasso alguns exercem um psicanalismo indolor em lugar de um historicismo ofensivo. Não nos estamos referindo a qualquer atitude geral dos psicanalistas franceses em 1968: ali, encontra-se de tudo. A cada dia, nova barricada se ergue: dever-se-á continuar sublinhando a neutralidade analítica, ou deixar-se afetar pelo acontecimento, ele mesmo analítico, em novo sentido? Alguns descem às ruas, pensem-se, ou não, como veículos das estruturas, afixando avisos à porta: "O psicanalista está na manifestação". Outros cobram de seus clientes as sessões a que estes não comparecem por estar chutando bombas de gás lacrimogêneo ou atirando pavés, em busca de "outra cena". Outros ainda - os mais numerosos - aguardam no silêncio para o qual foram tão bem treinados o final da cena, a fim de fazer uso profético (e lucrativo) do a posteriori. A ninguém escapa, no entanto, a ausência de inocência de qualquer atitude, neste momento de exacerbação da palavra poética e crítica. Assim, em 23 de maio, Le Monde publica um manifesto de setenta psicanalistas em apoio aos estudantes, enfatizando a motivação política das ações - afirmação essencial em um momento em que outros dão início à reinscrição da revolta nos limites do drama edipiano.

Pouco antes do manifesto, Lacan e demais membros da Escola Freudiana de Paris marcam um encontro com participantes do 22 de março. Quase não há diálogo: estes falam, aqueles escutam. Até que Lacan pergunta: "O que podemos fazer por vocês?" E Danny responde rápido, em seu estilo intempestivo: "Atirar um pavé!" (HAMON e ROTMAN, 1987:526). O espírito de seriedade da reunião se esvai como que por encanto. Na seqüência, os estudantes estendem a mão e as posições se invertem: os analistas pagam para ouvir, e pagam bem - o hábito supera a economia. Obtidos cerca de dois mil francos, o 22 de março delibera rapidamente, tempo-lógico dos que amam as ruas. Seguros de que a revolução será uma festa imotivada, ou não será revolução, os estudantes vão jantar no La Coupole. Ali encontram muitos dos doadores, que se espantam, ou se indignam, ao constatar que "o dinheiro dos divãs serve para encher a pança dos alegres chefes da comuna estudantil"(ROUDINESCO, 1988:488). No dia seguinte, Lacan interrompe seu seminário, seguindo o apelo à greve lançado pelo Sindicato dos Professores do Ensino Superior. Aproveita para provocar os discípulos:

"Venho-me matando em dizer que os psicanalistas devem esperar alguma coisa da insurreição; há quem retruque: que quereria a insurreição esperar de nós? A insurreição lhes responde: o que esperamos de vocês é, se este for o caso, que nos ajudem a atirar os paralelepípedos"(apud ROUDINESCO, 1988:488).

Belo exercício de escuta literal, sem dúvida. Mas Lacan não é dos que se molham sem garantir maestria. A falação prossegue achatando o múltiplo sob o imperialismo do significante: os paralelepípedos e as bombas de gás são ditas preencher a função do objeto pequeno a e o suposto reichianismo subjacente ao maio é teoricamente demolido. Há que revoltar-se, mas sem perder o monopólio de legitimidade savante.

O lacanismo e suas "manques" (faltas a ser, interdições e impossíveis restaurações narcísicas) oferecerá um psicanalismo comedido e simbólico em substituição ao libertarismo desenfreado e imaginário das barricadas do desejo. A "outra cena" deve, lucidamente, deslocar-se das ruas para o divã. Qual um Haussman (34) a abrir largas avenidas asfaltadas onde ficavam becos e vielas recobertos de pavés, um Lacan triunfante dará aos convencidos pelos arautos do fracasso a oportunidade de compreender as dificuldades inerentes à transgressão da lei e as ilusões que compõem a luta pelas revoluções. Fascinados pelo formalismo lógico e matemático, Lacan e discípulos estarão aptos a estabelecer uma conceituação isenta de ambigüidades: a revolução, tanto more geometrico como etimológico, significa "retorno ao mesmo ponto". Como queríamos demonstrar...

Em 1972 Robert Castel publicará um trabalho empolgante, intitulado O Psicanalismo, desconstruindo as virtudes revolucionárias a priori da "outra cena" psicanalítica. Com ele, haverá luz sobre a sombra lançada por estes herdeiros do fracasso: despolitização, privatização, psicologização. Bem antes de Castel, porém, naqueles tempos em que todos podiam tornar-se autores de um escrito singular da noite para o dia, o desconhecido Herbert Tonka & fez, através de Fiction de la contestation alienée, a análise - institucional - do "freudo-lacano-marxismo" nascente, assim sintetizada na pena de S. Turkle:

"Explode uma revolução estudantil (...).O governo recorre a seu "Laboratório de Toxicologia Psicanalítica" e declara que a principal vantagem de usar armamentos psicanalíticos para distrair os radicais está no fato de que estes sequer se dão conta de que estão sendo distraídos. Enquanto os estudantes teorizam sobre a política do desejo, continuam pensando que estão empenhados em uma ação política. O movimento social decai à medida que as energias voltam a se concentrar na produção de uma ideologia radical de inspiração psicanalítica".(TURKLE, 1983:103)

Após tantos paralelepípedos críticos atirados sobre analistas, profetas e herdeiros, menos ainda aspiramos a compreender maio de 68, cônscios do que habitualmente significa este termo: fixação do acontecimento como ponto intermediário entre uma origem sempre recuada e um telos infinitamente adiado, propiciando, àquele que escreve, o domínio do que está em jogo.

Recordemos, a este respeito, a publicação, em 1968, de Diferença e Repetição, livro-ferramenta manejado por G. Deleuze contra as identidades e as representações. Acerca de Deluze, notas biográficas assinalam: " (...) nunca aderiu ao Partido Comunista, (...) nunca renunciou a Marx, nunca repudiou o Maio de 68" (SÉGLARD, 1991:174). Contentemo-nos com o "não repúdio": o maio não precisa de mais do que isso para permanecer como virtualidade de deslocamento e fortalecimento críticos na transformação do cotidiano.

Deleuze sempre foi prudente ao referir-se a maio de 68. Mesmo a pulicação de O Anti Édipo, em 1972, não representa discurso sobre o acontecimento, e sim potencialização, via escritura, de seus efeitos. Numa entrevista mais tardia, entretanto, o filósofo ensaia abordá-lo diretamente:

" Maio de 68 foi um devir fazendo irrupção na história, e é por isso que a história o compreendeu tão mal, e a sociedade histórica tão mal o assimilou"(DELEUZE, 1991: 28).

Estando o campo da história-disciplina tão percorrido por filosofias identitárias que quase se sufoca por ausência de possíveis, Deleuze é quase que forçado a passar às geografias e cartografias: algo devém, está em fuga, está fora dos quadriculamentos discursivos, políticos, subjetivos. O maio seria um desses devires - histórico-minoritários, histórico com minúsculas - , a pôr em questão, via forças não territorializadas ou pré-codificadas, a História com maiúsculas - campo dos sedentarismos, Estados e imperialismos significantes de todos os tipos. Os paralelepípedos não são um objeto pequeno a ou, melhor dizendo, faremos todo o possível para que não o sejam. Em outras palavras, o inconsciente, deve-se produzi-lo como linha de fuga a nossos panópticos cotidianos, sejam eles políticos, históricos ou psicanalíticos. Não porque o inconsciente seja a Verdade do Sujeito ou o Sujeito da História, mas porque não há nem Sujeito nem Verdade nem História: estamos desde sempre enredados em multiplicidades processuais (ou institucionais).

UM EIXO TRANSVERSAL?

Apesar de tantas precauções, chegamos ao final deste trabalho ainda temerosos de que o conjunto de nossas considerações possa levar a uma leitura tranqüilizante, baseada na suposição de que maio de 68 tenha representado a instauração de um eixo transversal nos regimes de verdade, prática e subjetivação, a superar, à maneira de bela síntese hegeliana, a horizontalidade do pós-guerra e a verticalidade do período anti-colonial. Embora concordemos que, se alguma linha pode ser traçada para assinalar este final de rosto histórico, seja ela transversal, decerto é, igualmente, quebrada e descontínua: estética de nomadismo mais que formalismo cartesiano; linha que "funciona mal"(35) e, exatamente por isso, maquina novas possibilidades.

Se antes de 1968 as conexões entre os diferentes anti-colonialismos, externos ou internos, são bastante frágeis, quando não dificultadas por incompatibilidades doutrinárias ou institucionais, e se, durante o próprio maio, irrompe uma formidável conexão expansiva, apta a deixar para trás eventuais divergências, de forma alguma resulta daí qualquer unificação totalizadora. Sendo assim, não façamos de 68 mais do que ele efetivamente é: grande recusa, e não recusa de tudo, tampouco movimento que tudo conecta transversalmente. Felix Guattari, atento ao risco da morte do acontecimento, jamais se cansou de recordá-lo:

"(...) pretendíamos colocar no mesmo plano militantes vítimas da repressão e o conjunto dos pirados, dos prisioneiros comuns, dos Katangais (36), dos psiquiatrizados. Na ocasião, até os espontaneístas do ex-22 de março (...) diziam: "prisioneiros políticos, sim, mas comuns, absolutamente! Drogados, não!"(...) Pelo fato de querer falar ao mesmo tempo de questões ditas políticas e de problemas da loucura, passávamos por personagens barrocos e até perigosos".(GUATTARI, 1981e:129)

Neste fragmento revela-se uma rejeição, durante maio de 68, ao que nos atrevemos a apelidar "lumpen" da política - loucos, prisioneiros de direito comum, delinqüentes, drogados -, ainda considerados, por muitos militantes, algo a ser excluído do trabalho "sério", por mais que tal seriedade portasse ares de festa. Conquanto não nos agrade falar ao estilo da falta, é difícil expressar esta idéia a não ser dizendo que, no maio, não estão constituídos os que virão a ser chamados "novos movimentos sociais" - de prisioneiros, mulheres, homossexuais; anti-racistas, anti-psiquiátricos, etc. Quando muito, alguns estão em vias de constituição (37). A este respeito, por sinal, dispomos de uma sugestiva observação de Alain Touraine que, analisando a instalação na Universidade, no pós-68, da maior parte daqueles que a contestavam, ressalta a acentuação de um corte entre o mundo da academia e o mundo social: "O discurso 68 se apodera da universidade, enquanto que o vivido 68, cassado da universidade, se reencontra entre as mulheres, os trabalhadores imigrados, os homos...".(apud DOSSE, 1992: 181)

Pouco a pouco institucionalizados, muitos dos discursos contestadores se esvaziam da força crítica que exerciam: como contestar uma universidade na qual são os mais recentes mandarins? Como permanecer anti-colonialista quando se está preso ao mandato social de herdar o fracasso de um movimento em que todos fomos outros? Como o leitor pode perceber, começamos a nos distanciar de 68, a penetrar no pós-maio. A figura é ainda oscilante, mas parece apontar para novos regimes: alguns buscam uma linguagem para 68, a fim de conceituar-lhe o fracasso; outros se recusam a renegá-lo, insistindo em que "não somos nada mais e nada além daquilo que acontece atualmente"(FOUCAULT, 1979: 239). Para os primeiros, a política, a sociedade e o sujeito são dotados de alguma "natureza" ou "estrutura" que deve, de agora em diante, orientar o caminho correto. Para os últimos, entre os quais nos situamos, é hora de novas análises, prontas a pensar o presente, a atuar em ruptura com o intolerável que este porventura veicule, a desprender-se do que ele nos faz pensar, ser e sentir.

Através do longo percurso de uma historicização que se deseja efetiva, este trabalho descobriu (ou redescobriu) os começos de algumas de suas bibliotecas, onde estão as indisciplinadas disciplinas do desejo para os que almejam praticar novas análises. A fim de que sejam reconhecíveis pela tradição, chamemo-las Psicossociologia-Sociologia (a da Socioanálise de Lourau e Lapassade) e Cartografia-Filosofia (a da Esquizoanálise de Deleuze e Guattari). Há que enfatizar, porém, que suas características fundamentais são o desconstruir bem arrumados setores do saber, o desregular índices de fichas catalográficas, o subverter os títulos das tiranias do psíquico, social, filosófico e/ou histórico com maiúsculas. Sejamos mais precisos: estas características não lhes pertencem por essência. Só o modo de funcionamento daquele que lhes maneja as ferramentas, ou para elas inventa novas, pode favorecer ou minar a vida destas novas análises. Ficcionar-lhes as histórias destotalizadas, fragmentárias e múltiplas foi o caminho que escolhemos em prol do primeiro destino.

No pós-68, estão começadas Socioanálise e Esquizoanálise. O nascimento oficial da primeira está identificado com uma tese de Estado: A análise institucional, de R. Lourau, datada de 1969. O da segunda, com um "livro-coisa", O anti-édipo (1972), em que isso - o inconsciente ou desejo - "funciona (...) respira (...) aquece (...) come (...) caga (...) fode."(DELEUZE e GUATTARI, s/d: 7). O evidente respeito à norma universitária, no primeiro caso, e o aparente desafio impresso, no segundo, não carecerão de conseqüências sobre suas respectivas carreiras.

Em 1976, Lourau, Lapassade e alguns companheiros estão instalados no Departamento de Ciências da Educação da Universidade de Paris VIII -Vincennes (38). No posfácio à reedição de A análise institucional, então publicada, observa Lourau:

"Sob o pretexto de teorização, generalização e ordenação conceitual, escrevi um livro frio sobre um assunto candente. Teorizar não seria criar, pouco ou muito, este dispositivo panóptico do qual Foucault mostrou a importância? Ver sem ser visto, (...) vigiar, punir, tais são implicitamente os objetivos da teoria (...)"(LOURAU, 1988: 250).

Em 1972/73, as apropriações freudo (lacaniano)-marxistas de maio de 68 têm bases solidamente instaladas na universidade, edição, mídia e grupúsculos políticos. Lançando O Psicanalismo, R. Castel ressalta a distância entre O anti-édipo e esses tipos de concepção, que jamais ousam se afastar demasiado das legitimações emprestadas pelos mestres. Por eliminarem a barreira entre teoria do inconsciente e teoria social, dotando o desejo de uma materialidade que o põe na base (infra-estrutura) do sistema, Deleuze e Guattari são ditos capazes de implodir o edifício das corporações da intelligentzia. Apesar disso, Castel divisa um perigo nos efeitos do livro esquizoanalítico. Na relação essencial que mantém com a Psicanálise, o trabalho pretende desalojá-la do lugar de legítima teoria do desejo, denunciando-a enquanto avatar a mais do pensamento da identidade-representação. O problema se situa na existência paralela de uma relação acidental: por fazer da Psicanálise um de seus alvos, o projeto esquizoanalítico arrisca-se, malgré lui, a aceitar um combate restrito ao plano da técnica ou da experiência clínica. Assim formula Castel seus receios de que o intencionalmente acidental se torne institucionalmente prioritário:

"(...) em que medida o Anti-Édipo se situa na ponta extrema de um movimento de fuga para diante, explicável a partir de um mal-estar na Psicanálise? Em que medida ele em parte não permanece uma crítica do conteúdo da Psicanálise, ao propor "uma reversão interna que faz da máquina analítica uma peça indispensável do aparelho revolucionário?"(CASTEL, 1978: 233)

Fazendo referência à preocupação de Lourau com a panoptização da Socioanálise e à de Castel com a psicanalização da Esquizoanálise, encontramo-nos em meio aos regimes característicos do pós-68. Estes, todavia, já exigiriam a construção de novas histórias, novas ficções...

 

NOTAS:

1- Em RODRIGUES (1994), esta forma de história, inspirada na genealogia foucaultiana, é caracterizada como desnaturalizadora/produtivista/micro, transdisciplinar/transversalizante e historicamente ontologizadora. Para uma exposição detalhada do sentido de tais categorias, pode-se também consultar RODRIGUES (1998)

2 - Bandung: cidade da Indonésia onde se realizou a conferência que reuniu, em 1955, os países que pretendiam, em meio à Guerra Fria horizontal, definir-se como não-alinhados. Billancourt: cidade francesa sede das fábricas Renault, tomada como nome-símbolo de uma revolução proletária sempre à beira de se realizar, dentro do pensamento comunista oficial (leia-se Partido Comunista Francês).

3 -Uma das belas denominações pela qual se designam os acontecimentos de maio de 68.

4 - Revista fundada em 1956, reivindicando o adjetivo revisionista, até então categoria de acusação nos meios de esquerda. Pretende questionar todos os postulados orientadores, propondo um degelo intelectual para o pensamento crítico. Os editores (E.Morin e K.Axelos) decretam o final da publicação em 1962, depois de ter tido, entre seus colaboradores, F.Châtelet, L.Goldmann, C.Lefort, G.Lapassade, G.Deleuze, R.Barthes e H.Lefebvre.

5 - Grupo e revista fundados, respectivamente em 1946 e 1949, por C. Castoriadis e C. Lefort. De início ligado à seção francesa da IV Internacional , S.ou B. logo rompe com a versão trotskista da burocratização soviética como acidente histórico, elaborando uma análise original dos determinantes conducentes ao estabelecimento de um regime de exploração e dominação na U.R.S.S. Muito isolado no imediato pós-guerra, o grupo ganha novo alento com os acontecimentos de 1956 (Relatório Kruschev sobre crimes do stalinismo, invasão da Hungria pelas tropas do Pacto de Varsóvia), passando a ser interlocutor privilegiado dos críticos da burocracia. A revista se encerra em 1965, e o grupo, através de um manifesto de auto-dissolução, em 1967. Detalhes acerca do percurso de S.ouB. podem ser encontrados em RODRIGUES (1998a).

6 - Grupo e revista criados ao final da década de 50 pr um grupo de jovens - sendo os mais conhecidos Guy Debord e Raul Vaneigen -, que se auto-intitulam "vanguarde cultural". Acusam de reformistas os grupos que se pretendem modernos e revisionistas, como Arguments e Socialismo ou Barbárie, preferindo a "fórmula-choque" e a instauração concreta de "situações" rupturais às intermináveis revisões teóricas dos marxistas críticos.

7 - Filme francês dirigido por Yves Robert, lançado em 1962.

8 - Segundo CASTEL (1978), as histórias de tipo retrospectivo ocultam a existência de duas fases na Psicoterapia Institucional francesa. Nas primeiras experiências, mesclavam-se Pavlovismo, Psicanálise, Fenomenologia e Psicologia da Gestalt. A partir de meados dos anos 50 estas misturas começam a parecer absurdas teórica e politicamente, passando-se, desde 58, da primeira versão (eclética, com dominante marxista e ativa presença de militantes comunistas) à segunda (influenciada por Lacan e inteiramente desvinculada do PCF).

9 - Em meados dos anos 50, o Comissariado Europeu, como parte do Plano Marshall - cooperação americana para a reorganização econômica da Europa -, envia aos EUA missões de intelectuais e jovens patrões, a fim de que se familiarizem com as novidades em gestão empresarial e formação permanente.

10 - Para a Psicoterapia Institucional a instituição designa, a princípio, uma forma social particular, seja concreta (o estabelecimento), seja jurídica (a organização); em um segundo momento, formas de organização das práticas, como grupos, clubes, oficinas, etc. Ver, a respeito, RODRIGUES e SOUZA (1992)

11- Quando de sua morte, relembraram-se quatro encontros virtualmente capazes de - embora efetivamente impotentes para - ter definido caminhos totalizantes para este "mestre da arte da desorganização sistemática" (título que lhe empresta a manchete de Libération em 31.08.92): J.Oury, J.Lacan, a Antipsiquiatria e G.Deleuze.

12 - Hospital pioneiro, durante a Segunda Guerra, nas experiências de Psicoterapia Institucional, lideradas por François Tosquelles. Sobre a importância, então, da resistência à ocupação alemã, ver RODRIGUES (1998b)

13 - A Teoria das Duas Ciências é uma reatualização, no pós-guerra, das proposições elaboradas no início do século por Bogdanov, afirmando diferenças de natureza entre ciência burguesa e ciência proletária. Nesta linha, La Nouvelle Critique traz à cena, em 1949, o texto A Psicanálise: uma ideologia reacionária, no qual os psiquiatras do PCF, inclusive os simpatizantes da doutrina freudiana (Lebovici, Bonaffé, Le Guilland, etc.), realizam uma condenação totalizante da disciplina.

14 - Bueaux d’Aide Psychologique Unniversitaire, criados pela MNEF, que diagnostica, no meio universitário francês de então, uma verdadeira fonte de patologias para os estudantes.

15 - Propostos pela Esquerda Sindical da UNEF, eram grupos de 5 ou 6 integrantes nos quais se desejava romper o isolamento dos estudantes universitários, possibilitando o confronto dos processos de aprendizagem.

16 - VEYNE (1982) relaciona a historicização foucaultiana à prática de tomar pelo meio, conforme concebida por Deleuze.

17 - Em 1967, Régis Debray, ex-aluno da Escola Normal Superior e antigo discípulo de Althusser, foi preso na selva boliviana quando participava do foco guerrilheiro de Che Guevara.

18 - A nova organização substitui o sistema de certificados em disciplinas, cuja acumulação dava direito a uma licenciatura, por uma seqüência de três ciclos, correspondendo o término do segundo à obtenção daquela titulação.

19 - Cores do anarquismo e do marxismo.

20 - O documento exibe enorme semelhança com as teses de Castoriadis, denunciando a burocracia política central como classe dominante. Para maiores detalhes, ver MAGNOLI (1992:103)

21 - Em 5 de janeiro de 1968, o stalinista Antonin Novotny &, após uma série de protestos liderados por escritores e estudantes, foi substituído, à testa do Comitê Central do Partido Comunista Tcheco, pelo "jovem Dubcek". Não era tão jovem em idade - contava 46 anos -, mas representava, para o Leste Europeu, a juventude do socialismo, a "linha humanista", de início sob o vigilante beneplácito de Moscou.

22 - Espécie de "Internacional Comunista" que, em 1948, substitui o antigo Komintern, extinto em 1943. A acusação de "sionismo" representava, no Kominform, uma das principais bases para os "processos de Moscou".

23 - Talvez em 1967/68, mais do que em qualquer outro momento, seja sensível a questão internacionalismo versus nacionalismo-xenofobia. Enquanto os revoltosos de todo o mundo devêm "outros", os contra-revoltosos insistem em remeter "cada macaco a seu galho". No caso da acusação de "sionismo", as circunstâncias favorecem os discursos da contra-revolta: em junho de 1967, com o crescimento das tensões no Oriente Médio, as forças armadas israelenses, sob o comando de Moshe Dayan, iniciam a "Guerra dos 6 dias", com apoio dos EUA.

24 - 22 de março: data em que os estudantes de Nanterre ocupam o edifício da administração; nome que toma o movimento constituído a partir desta ação.

25 - Maios: americano (recusa da guerra do Vietnã, deserção, desobediência civil, hippies, flower power, black power); alemão (renovação cultural; anti-autoritarismo; crítica do marxismo ortodoxo; Universidade Livre; anti-imperialismo); polonês (socialismo e liberdade; crítica esquerdista do marxismo petrificado), tcheco (idem); japonês (anti-imperialismo; anti-militarismo; anti-satelização do país pelos EUA); espanhol (anti-ditadura franquista e suas sustentações internacionais); italiano (anti-autoritarismo universitário, crítica da sociedade de consumo), brasileiro (contra o golpe militar de 64, os acordos MEC-USAID e todos os imperialismos); argentino (o "Cordobazzo", em 1969, desafiando calendários oficiais); mexicano (pela democratização do sistema político, contra a repressão policial) e também holandês, belga, suíço, inglês, dinamarquês, turco, iugoslavo, argelino, tunisiano, marroquino, senegalês, peruano, chileno, venezuelano, malgaxe, etc. O mundo sem fronteiras rígidas. Para uma ótima síntese, ver MATOS (1981).

26 - A este respeito, ver GUATTARI (1981c), texto que retoma este slogan para fazer do "minoritário" a afirmação de um modo de ação política.

27 - A "história oficial" atribui a formulação a Lucien Goldmann, em 1969, no debate que se segue à conferência O que é um autor?, de M. Foucault, na Sociedade Francesa de Filosofia. (Ver FOUCAULT, 1991: 80)

28 - Comitê de ação: principal forma de agrupamento adotada no maio. São unidades diretamente ligadas à agitação, sem subordinação hierárquica a centros decisórios. Obedecem a princípios simples: bases variadas (profissão, local de moradia, trabalho, etc.); pequenas dimensões (10 a 30 pessoas), reuniões diárias, iniciativas próprias, comunicação permanente entre os membros, com o comitê de coordenação e com outros comitês.

29 - Esta formulação se deve à leitura deleuzeana de Nietzsche: "O poder, como vontade de poder, não é o que a vontade quer, mas aquilo que quer na vontade" (DELEUZE, 1990:22).

30 - Por acontecimento analisador (ou analisador histórico), os institucionalistas indicam um movimento social que vem a nosso encontro inesperadamente, condensando uma série de forças até então dispersas e realizando por si mesmo a análise, à maneira de um catalisador químico de substâncias.

31 - Aqui, o significante se encontra aleatoriamente a serviço da ação: a partir do 22 de março, só um gai savoir (ou savoir faire) importa.

32 - Segundo Guattari (1981d:140), "o inconsciente molha os que dele se aproximam".

33 - Lourau aproxima as "ações exemplares" do 22 de março dos "analisadores" dos institucionalistas, pois permitem a revelação, em ato, do funcionamento dos poderes.

34 - Arquiteto responsável pela Paris das largas avenidas, dispositivo de guerra contra os revolucionários de 1848 e communards de 1871.

35 - Para Deleuze e Guattari, paradoxalmente, só funciona bem a máquina que funciona mal.

36 - Nome atribuído a um grupo de delinqüentes que se refugia na Sorbonne ocupada, pois um deles afirma ter sido mercenário em Katanga.

37 - Sobre este tema, consultar GUATTARI (1986).

38 - A inserção universitária dos socioanalistas, no pós-68, não foi assim tão tranqüila. Quando Lapassade disse a R. Castel, membro do núcleo de recrutamento, de seu desejo de lecionar no centro experimental de Vincennes, recebeu resposta negativa: os sociólogos desejariam preservar sua "coerência epistemológica". Em conseqüência, Lapassade ocupará o cargo de professor no Departamento de Ciências da Educação, no qual se concentrarão os socioanalistas.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

BARBIER, R. - Pesquisa-ação na instituição educativa. Rio de Janeiro: J. Zahar, 1985.

BAREMBLITT, G. - Compêndio de Análise Institucional e outras correntes. Rio de Janeiro: Rosa dos Tempos, 1992

CALVET, L.-J. - Roland Barthes. Paris: Flammarion, 1990.

CARDOSO, I. - "68: a comemoração impossível". Tempo Social, vol.10, nr.2, out/98.

CASTEL, R. - O psicanalismo. Rio de Janeiro: Graal, 1978.

CASTORIADIS,C.;LEFORT,C.; MORIN,E. - Mai 1968: la brèche. Paris: Fayard, 1968

COHN-BENDIT et al. - A revolta estudantil. Rio de Janeiro: Laudes, 1968.

COIMBRA, C. M. B. - Guardiães da ordem: uma viagem pelas práticas "psi" do Brasil do "milagre". Rio de Janeiro: Oficina do autor, 1995.

DELEUZE, G. - Nietzsche. Lisboa: Edições 70, 1990.

DELEUZE, G. -"Signos e acontecimentos". Em Escobar, C. H.(org.) -Dossier Deleuze. Rio de Janeiro: Hólon, 1991.

DELEUZE, G.; GUATTARI, F. - O anti-Édipo: capitalismo e esquizofrenia. Lisboa: Assírio e Alvim, s/d.

DELEUZE,G.; GUATTARI, F. - "Entrevista I" . Em CARRILHO, M. M. (org.) - Capitalismo e esquizofrenia: dossier anti-édipo. Lisboa: Assírio e Alvim, 1976.

DOSSE, F. - Histoire du structuralisme vol.2. Paris: La Découverte, 1992.

DUBOST, J.; LÉVY, A. - "El análisis social". Em GUATTARI, F. et al. - La intervención institucional. México: Folios, 1981

FERRY, L.; RENAUT, A. - Pensamento 68: ensaio sobre o anti-humanismo contemporâneo. São Paulo: Ensaio, 1988.

FONVIEILLE, R. - "Elements pour une histoire de la pédagogie institucionelle". Em HESS, R.; SAVOYE, A. (orgs.) - Perspectives de l'analyse institutionelle. Paris: Méridiens Klincksieck, 1988.

FOUCAULT, M. - Folie et déraison: histoire de la folie à l'âge classique. Paris: Plon, 1961.

FOUCAULT, M. - "Não ao sexo-rei". Em Microfísica do poder. Rio de Janeiro: Graal, 1979.

FOUCAULT, M. - "Interview with Lucette Finas". Em MORRIS, M.; PATTON, P. (eds.) - Michel Foucault: power, truth and strategy. Sidney: Feral Publications, 1980.

FOUCAULT, M. - O que é um autor? Lisboa: Vega, 1991.

GUATTARI, F. - "Reflexiones para filósofos sobre la psicoterapia institucional". Em Psicoanálisis y transversalidad. Buenos Aires: Siglo XXI, 1976

GUATTARI, F. - "Introducción a la psicoterapia institucional". Em Psicoanálisis y transversalidad. Buenos Aires: Siglo XXI, 1976a.

GUATTARI, F.- "La causalidad, la subjetividad y la historia". Em Psicoanálisis y Transversalidad, 1976b

GUATTARI, F. - "El grupo y la persona". Em Psicoanálisis y transversalidad. Buenos Aires: Siglo XXI, 1976c

GUATTARI, F. - "Entrevista". Em La intervención institucional. Mexico: Folios, 1981

GUATTARI, F.- "A transversalidade". Em Revolução molecular. São Paulo: Brasiliense, 1981a

GUATTARI, F. - "A transferência". Em Revolução molecular. São Paulo: Brasiliense, 1981b

GUATTARI, F. - "Somos todos grupelhos". Em Revolução molecular. São Paulo: Brasiliense, 1981c

GUATTARI, F. - "Pistas para uma esquizoanálise: os oito princípios". Em Revolução molecular. São Paulo: Brasiliense, 1981d

GUATTARI, F. - "Antipsiquiatria e antipsicanálise". Em Revolução molecular. São Paulo: Brasiliense, 1981e

GUATTARI, F. - "As novas alianças: movimentos sociais e movimentos alternativos". Desvios, nr.5, mar/1986.

HAMON, H.; ROTMAN, P. - Genération I: les années de rêve. Paris: Seuil, 1987.

HESS, R. - Henri Lefebvre et l'aventure du siècle. Paris: Métailié, 1988.

HESS, R., SAVOYE, A. - L'analyse institutionelle. Paris: P.U.F., 1993.

LAPASSADE, G. - A entrada na vida. Lisboa : Edições 70, 1975.

LAPASSADE, G. - "Préface". Em LOURAU, R. - L'illusion pédagogique. Paris: Épi, 1969

LAPASSADE, G. - Grupos, organizações e instituições. Rio de Janeiro: F.Alves, 1977.

LAPASSADE, G. - "El aprendizaje del análisis" Em LOURAU, R.et al. - El análisis institucional. Madri: Campo Abierto, 1977a

LAPASSADE, G. - "Función pelagógica del T-Group". Em El analizador y el analista. Barcelona: Gedisa, 1979.

LAPASSADE, G. - "El seminario de Lys-chantilly". Em El analizador y el analista. Barcelona: Gedisa,1979a.

LAPASSADE, G. - Socioanálisis y potencial humano. Barcelona: Gedisa, 1980.

LAPASSADE, G. - "La intervención en las instituciones de educación y de formación". Em GUATTARI, F. et al. - La intervención institucional. México: Folios, 1981

LEFORT, C. - "A desordem nova". Em MORIN, E. et al. - Maio 68: inventário de uma rebelião. Lisboa: Moraes, 1969.

LOURAU, R. - "Pour une nouvelle pédagogie". Em L'illusion pédagogique. Paris: Épi, 1969

LOURAU, R. - "Une dimension de l'institution: la demande sociale". Em L'illusion pédagogique. Paris: Épi, 1969a

LOURAU, R. - A análise institucional. Petrópolis: Vozes, 1975.

LOURAU, R. et al.- El análisis institucional. Madri : Campo Abierto, 1977.

LOURAU, R. - L'état inconscient. Paris: Minuit, 1978.

LOURAU, R. - Sociólogo em tempo inteiro. Lisboa: Estampa, 1979.

LOURAU, R. - L'autodissolution des avant-gardes. Paris: Galilée, 1980.

LOURAU, R. - Le journal de recherche. Paris: Méridiens Klincksieck, 1988.

LYOTARD, F. - "El 23 de marzo". Em A partir de Marx y Freud. Madri: Fundamentos, 1975.

LYOTARD, J. F. - "Deriva a partir de Marx y Freud". Em A partir de Marx y Freud. Madri : Fundamentos, 1975a.

MAGNOLI, D. - O mundo contemporâneo. São Paulo: Ática, 1992.

MATOS, O. C. F. - Paris 1968: as barricadas do desejo. São Paulo: Brasiliense, 1981.

MATOS, O.C.F. - "Tardes de maio". Tempo Social, vol. 10, nr.2, out/98

OURY, F.; VASQUEZ, A. - Vers une pédagogie institutionelle. Paris : Maspero, 1982.

PROST, A. - Éducation, société et politique - une histoire de l'enseignement en France de 1945 à nos jours. Paris: Seuil, 1992.

RIOUX, L.; BLACKMANN, R. - L'explosion du mai. Paris: Robert Laffont, 1968.

RODRIGUES, H.B.C. e SOUZA, V.L.B. - "A análise institucional e a profissionalização do psicólogo". Em Saidón, O. e Kamkhagi, V.R.(orgs.) - Análise institucional no Brasil. Rio de Janeiro: Rosa dos tempos, 1992

RODRIGUES, H.B.C. - As subjetividades em revolta: institucionalismo francês e novas análises. Dissertação de mestrado. IMS/UERJ, 1994

RODRIGUES, H.B.C. - "Quando Clio encontra Psyché: pistas para um (des)caminho formativo". Cadernos Transdisciplinares, nr.1, UERJ:1998

RODRIGUES, H.B.C. - "Cura, culpa e imaginário radical em Cornelius Castoriadis: percursos de um sociobárbaro". Revista de Psicologia da USP, v.9, nr.2,.1998a

RODRIGUES, H.B.C. - "Um anarquista catalão: aventuras do freudo-marxismo na França". Cadernos de Psicologia - série Institucional, v.8, 1998b.

ROUDINESCO, E. - História da psicanálise na França, vol. 2. Rio de Janeiro: J. Zahar, 1988.

SAIDÓN, O.; KAMKHAGI, V. R. (orgs.) - Análise institucional no Brasil. Rio de Janeiro: Rosa dos Tempos, 1992.

SÉGLARD, D. - "Bibliografia comentada de Deleuze". Em ESCOBAR, C. H. (org.) - Dossier Deleuze. Rio de Janeiro: Hólon, 1991

TURKLE, S. - Jacques Lacan: la irrupción del psicoanálisis en Francia. Buenos Aires: Paidós, 1983.

VEYNE, P. - "Foucault revoluciona a história". Em Como se escreve a história. Brasília: EUB, 1982

Volver al sumario del Número 10
Revista de Psicoanálisis y Cultura
Número 10 - Diciembre 1999
www.acheronta.org