Acheronta  - Revista de Psicoanálisis y Cultura
A textualidade do inconsciente
Do Bereshit ao Finnegas Wake

Gustavo Capobianco Volaco

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CARTAS AO VENTO?

 Recontaremos uma história já bastante conhecida, se não por todos, sem dúvida por muitos: lá estava a rainha lendo sua carta de amor quando é surpreendida pela entrada do rei e seu ministro. Assustada, ela procurar esconder seu segredo da forma mais despretensiosa possível e, se engana seu marido, não ludibria o outro intruso que se apossa ardilosamente do documento prevendo, para mais tarde, algum tipo de chantagem. A infiel rainha, que não quer se denunciar e nem poderia já que sua cabeça estaria em risco, prefere, no momento, não se pronunciar mas tão logo o rei e o ministro saem de seu boudoir destaca toda uma frente policial no encalço da carta roubada rompendo com seu mutismo circunstancial. E é aqui que entra a figura emblemática de Auguste Dupin – já famoso pelo desvendamento dos assassinatos na rua Morgue – pois o escrutínio policial nada alcançou em suas várias empreitadas e será do fracasso de uns que Dupin erigirá sua glória com as seguintes palavras finais: “un dessein si funeste, s’il n’est digne d’Atrée, est digne de Thyest” (POE, 1996, p. 93). E a carta volta a sua verdadeira dona!
Esse é, em linhas gerais, um resumo do famoso conto de Edgar Allan Poe, A Carta Roubada que quase alucina, no bom sentido, Jacques Lacan por fornecer, ponto a ponto, a estrutura de suas elaborações acerca do significante. Não fosse a homonínia entre carta e letra em francês, lettre, por si só produtora de comichões intelectuais, a forma como nos é narrado o conto já nos demonstra que:

Quando os personagens se apoderam desta carta, pode-se dizer que algo, que sobrepuja e de muito suas particularidades individuais, os pega e os arrasta. Sejam quem for, a cada etapa da transformação simbólica da carta, eles serão unicamente definidos pela sua posição em relação a este sujeito radical (...) Esta posição não é fixa. Na medida em que eles entraram na necessidade, no movimento próprio à carta, cada qual se torna, no decurso das sucessivas cenas, funcionalmente diferente em relação a realidade essencial que ela constitui. (LACAN,1987, p. 248)

E, em suma, nos mostra tratar-se aí de um “significante puro” (LACAN, 1988, p. 18). Expliquemos! Digamos que aquilo que estava escrito na carta, fosse – Poe não descreve realmente seu conteúdo mas nos deixa indícios claros daquilo que contêm – um nada simples “Eu te amo!”. Nas mãos da rainha, qual é seu valor? Uma carta de amor, certo? Mas quando entra o Rei, ela não muda de status e passa a significar traição? Se ele põe as mãos nela o sentido poderia ser a morte da rainha. E nas mãos do Ministro D.? Já vimos isso à pouco e seu significado é, digamos, de um eventual exercício de poder sobre a rainha. Na fuga das mãos da polícia, liderada por Monsier G. eis que a carta/letra denota uma incompetência avassaladora até que, aos cuidados de Dupin, ela torna-se um elemento de vingança, já que esse é o sentido da frase em francês que ele deixa a seu rival (1) e, depois, um presente cheio de astúcia a sua primeira destinatária.
Esquematicamente podemos indexar esses elementos da seguinte forma:

Para a Rainha: “Eu te amo” = “Ele me ama”
Para o Rei: “Eu te amo” = Corno
Para o Ministro D: “Eu te amo” = Chantagem
Para a Polícia: “Eu te amo” = Idiotia
Para Dupin: “Eu te amo” = Vingança e, junto = Competência
E, enfim, novamente para a Rainha: “Eu te amo” = Alívio

E levantarmos a questão: qual seria, de fato, o significado de “Eu te amo”? Se ele muda conforme a dança dos personagens e “tem um trajeto que lhe é próprio” (Idem, p. 32) não seria porque ele, por si, nada quer dizer? Qual é, afinal de contas o estatuto possível da letra, agora, não mais da carta mas, sobretudo, desta que nos forma seres-humanos? Que relações existem entre a estrutura própria do significante e nosso psiquismo? São essas questões que procuraremos decifrar nas próximas páginas. Que o leitor sinta-se convidado a nos acompanhar pois é a ele que frequentemente nos referiremos e é a ele que endereçamos nossa lettre.

 

 בבית היה מחוסר הכרה (2)

 

Sim bem primeiro nasceu o Caos
 Hesíodo (3)

Gostaríamos de chamar a sua atenção para o seguinte texto:
   
e   os céus   Deus   criou   Em início,
e escuridão   e vacuidade,   informidade   era   E a terra   a terra.
o que pairava   Deus,   e o espírito de    abismo;    sobre as faces de
luz;    Que haja    Deus;   E disse   as águas.   sobre as faces de
que boa;   a luz   Deus    E viu   e houve luz.
a escuridão   e entre    a luz   entre    Deus   e fez separação
chamou    à escuridão   dia,   à luz    Deus     E chamou
um      dia   e houve  amanhecer,      e houve entardecer   noite;
as águas;    no meio de       firmamento        Que haja       Deus:    E disse
E fez     de águas      águas     entre    o que faz separação  e que haja
que        as águas     entre      e fez separação       o firmamento,      Deus
acima de    que    as águas,     e entre     do firmamento     embaixo de
ao firmamento       Deus      E chamou   e aconteceu assim.     do firmamento
segundo       dia      e houve amanhecer,     e houve entardecer     céus;
terra     à terra seca   Deus   E chamou  e aconteceu assim
Deus    e viu    mares   chamou   as águas      e para o ajuntamento de
                                                     que bom. (FRANCISCO, 2012, p. 2 e 3)

Acreditamos que, sem muito vagar, terás compreendido tratar-se aí do trecho inicial do Gênesis, primeiro livro do Antigo Testamento. Mas, fazendo eco ao que supomos ter-lhe passado pela cabeça – fora a estranheza de, se não é judeu, ler da direita para a esquerda – formulamos a seguinte questão: e porque o que se leu, à pouco, não tem essa forma:

No princípio, Deus criou os céus e a terra. A terra era informe e vazia, havia trevas sobre a face da profundeza, e o Espírito de Deus pairou sobre a superfície da água. Então, Deus disse: “Haja luz”; e houve luz. Deus viu que a luz era boa, e Deus separou a luz das trevas. Deus chamou à luz Dia, e às trevas chamou Noite. Assim houve tarde e manhã, um dia.
Deus disse: “Haja um domo no meio da água; que ele separe água da água”. Deus fez o domo e separou a água acima do domo da água debaixo do domo; isso foi o que aconteceu, e Deus chamou o domo de Céus. Assim, houve tarde e manhã, o segundo dia.
Deus disse: “Que a água debaixo do céu seja reunida em um lugar, e que a terra seca apareça”, e assim aconteceu. Deus chamou à terra seca Terra, e à reunião de águas ele chamou Mares, e Deus viu que isso era bom.  (STERN, 2010, p. 73.)

Ou ainda essa?

No princípio, Deus criou o céu e a terra. Ora, a terra estava vazia e vaga, as trevas cobriam o abismo, e um sopro de Deus agitava a superfície das águas.
Deus disse: “Haja luz”, e houve luz. Deus viu que a luz era boa e Deus separou a luz e as trevas. Deus chamou à luz “dia” e às trevas “noite”. Houve uma tarde e uma manhã: primeiro dia.
Deus disse: “”Haja um firmamento no meio das águas e que ele separe as águas das águas”, e assim se fez. Deus fez o firmamento, que separou as águas que estão no firmamento das águas que estão acima do firmamento, e Deus chamou ao firmamento “céu”. Houve uma tarde e uma manhã: segundo dia.
Deus disse: “Que as águas que estão sob o céu se reúnam num só lugar e que apareça o continente”, e assim se fez. Deus chamou ao continente “terra” e à massa das águas “mares”, e Deus viu que era bom. (ZAMAGNA, 2010, p. 33 e 34).

Pois bem, respondemos, porque aquele excerto nada mais é que uma tradução literal do texto hebraico que encontramos na Edição Interlinear do Antigo Testamento, dado à lume pelo professor Dr. Edson de Faria Francisco. Literal porque pretende verter para o português o texto original hebraico e aramaico mantendo, nessa passagem, suas idiossincrasias semânticas e principalmente suas lacunas de significação. Talvez o leitor não saiba mas o Tanakah, datado entre os séculos IX e XI a.c. foi composto inicialmente  de forma consonantal e apenas na Idade Média recebeu notações e sinais gráficos, pelos chamados massoretas, de forma a registrar e representar os sons vocálicos e, aqui vem o mais importante, permitir uma certa linearidade textual pois, “sem elas (as vogais), as consoantes da maior parte das palavras hebraicas poderiam ser pronunciadas de diversas maneiras com significações diferentes ” (STERN, 2010, p. 38.). Assim, o trabalho realizado pelos escribas medievais judeus visava “1. Servir de demarcação melódica para a leitura do texto; 2. Assinalar a tonacidade das palavras e 3. Estabelecer relação sintática entre as expressões e os vocábulos do versículo” (FRANCISCO, 2012, p. XX), demonstrando, claramente, a necessidade de enxertar sentido onde antes não havia, ao menos de forma unívoca.
O texto do Dr. Edson encontra aí seu limite, pois leva em conta esse sinais gráficos vocalizantes massoréticos e opta por um sentido mas, ainda assim, herda as rupturas típicas da língua hebraica arcaica – o que não aparece nas outras duas versões da Bíblia que escolhemos utilizar aqui – convocando-nos a uma nova pergunta: porque isso interessa ou pode interessar a todos nós?
Lembremo-nos das seguintes palavras de Freud, razoavelmente iradas pois foi chamado, entre outras coisas, de bom cristão, endereçadas a seu amigo Oskar Pfister: “E, incidentalmente, por que a psicanálise não foi criada por um destes inúmeros homens piedosos, por que foi necessário esperar um judeu (4) inteiramente ateu.” (FREUD, 2009, p. 54). E depois, vale e pena citar suas ideias à respeito das leis do inconsciente quando expressas por sua via régia

Que representação fornecem os sonhos para “se”, “porque”, “como”, “embora”, “ou...ou”, e todas as outras conjunções sem as quais não podemos compreender as frases ou os enunciados?
Num primeiro momento (estamos no início da psicanálise), nossa resposta deve ser que os sonhos não tem a seu dispor meios de representar essas relações lógicas entre os pensamentos do sonho. Em sua maioria, os sonhos desprezam todas essas conjunções, e é só o conteúdo substantivo dos pensamentos dos sonhos que eles dominam e manipulam. (FREUD, 1987, p. 299 e 300)

E depois, em tópicos, para delimitá-las, as leis, um pouco mais:
Em primeiro lugar, os sonhos levam em conta, de maneira geral, a ligação que inegavelmente existe entre todas as partes dos pensamentos do sonho, combinando todo o material numa única situação ou acontecimento. Eles reproduzem a ligação lógica pela simultaneidade no tempo.
A alternativa “ou ... ou” não pode ser expressa em sonhos, seja de que maneira for. Ambas as alternativas costumam ser inseridas no texto do sonho como se fossem igualmente válidas.
O “não” não parece existir no que diz respeito aos sonhos. Eles mostram uma preferência particulr por combinar os contrários numa unidade ou por representá-lo como uma coisa só. (Idem, p. 301, 303 e 305)

Isso, em 1900. Mas não é nada mal evocar, também, suas colocações que encontramos, por exemplo, num texto escrito dez anos mais tarde:

O modo pelo qual os sonhos tratam a categotia de contrários e contradições é bastante singular. Eles simplesmente a ignoram. O “não” parece não existir. (...) Os sonhos tomam, além disso, a liberdade de representar qualquer elemento, por seu contrário (...) (Idem, p. 141)

E destacarmos, junto com Freud, sua íntima relação com as línguas arcaicas: “O comportamento do trabalho do sonho que acabei de descrever é idêntico a uma peculiaridade das línguas mais antigas que conhecemos”. ( Idem, 142).
Não fosse isso, não custaria nada evocar o escrito de Jacques Lacan A Instância da Letra ou a Razão desde Freud onde lemos:

A obra completa de Freud nos apresenta uma página de referências filológicas a cada três páginas, uma página de inferências lógicas a cada duas páginas, e por toda a parte, uma apreensão dialética da experiência, vindo a analítica linguageira reforçar ainda suas proposições à medida que o inconsciente vai sendo mais diretamente implicado.
Assim é que, na Ciência dos Sonhos (é assim que Lacan traduz Traumdeutung em 1957), trata-se apenas, em todas as páginas daquilo que chamamos a letra do discurso, em sua textura, seus empregos e sua imanência da matéria em causa. (LACAN, 1998, 513)

Um pouco antes: “é toda a estrutura da linguagem que a experiência psicanalítica descobre no inconsciente” (Idem, p. 506). E logo depois: “o trabalho do sonho segue as leis do significante” (Idem, p. 515). Razão, digamos, que culmina no aforismático “o inconsciente é estruturado como uma linguagem” (LACAN, 1986, p. 25) do mestre francês.
Seguindo este ordenamento de citações teçamos alguns comentários. O que haveria de específico na judeidade do “solitário de Viena” (LACAN, 2003, p. 18) que o deixaria apto a reconhecer o ciframento – e a propor o de-ciframento (5) – daquilo que de outra forma tenderia a permanecer na escuridão? Não seria, por um acaso, ter bebido, mesmo que apenas no berço, dessa escritura tão estranhamente composta – já que é dessa forma que a Torá se apresenta – que o prepara para a descoberta? Assim parece pensar Lacan em seu O Avesso da Psicanálise, quando em 15 de Abril de 1970 fala a seus alunos, de forma não decisiva, já que diz “talvez”, que:
A psicanálise talvez não seja concebível como nascida fora dessa tradição (hebraica). Freud nasceu nela e, como sublinhei, insiste em que só tem propriamente confiança, para fazer avançar as coisas no campo que descobriu, nesses judeus que sabem ler há muitíssimo tempo, e que vivem – é o Talmud – da referência a um texto (LACAN, 1992, p. 125-126)

E, para avançarmos, nos perguntemos: qual a diferença, mesmo, textual, entre este rébus:
Estava indo para o hospital com P. por um bairro em que havia casas e jardins. Ao mesmo tempo, tinha a noção de que já vira esse bairro muitas vezes em sonhos. Não sabia orientar-me muito bem por ali. Ele me indicou uma estrada que levava, dobrando a esquina, a um restaurante (fechado, não um jardim). Lá perguntei pela Sra. Doni e fui informado de que ela morava num quartinho dos fundos com três filhos. Dirigi-me para lá, mas antes de chegar, encontrei uma figura indistinta com minhas duas filhinhas; levei-as comigo depois de ter ficado com elas um pouquinho. Uma espécie de recriminação contra minha mulher por havê-las deixado lá. (FREUD, 1987, p. 416)

e este aqui:
o campo,   o vivente   dentre todo   astuta    era    E a áspide
à mulher   e disse    Deus;   YHWH    fez     que
dentre toda     comereis    Não    Deus;    que disse    É certo que
Do fruto de     à áspide:    a mulher    E disse    o jardim?   a árvore de
que      a árvore    mas do fruto de    comeremos;     a árvore do jardim
dele,    comereis    Não    Deus:    disse     no meio do jardim
a áspide    E disse    para que não morrais.    nele;   tocareis   e não
o que sabe    Porque     morrereis    Não morrer     à mulher:
se abrirão   dele,     o vosso comer     no dia de    que      Deus
bem     os que conhecem       como Deus,     e sereis     os vossos olhos;
                                                                e mal.(FRANCISCO, 2012, p. 9)

Estruturalmente, nenhuma!
Nos debrucemos agora sobre o trecho dedicado ao inconsciente. Freud, vimos, é enfático: não há, neste sistema, conectores lógicos que serviriam de ponte entre seus diversos conteúdos, ou melhor, pensamentos (gedanken). Não é isso, também, que acabamos de ler acima? A Vulgata, versão latina e a Septuaginta, a tradução grega da Blíblia, e que influenciaram suas versões correntes, são as responsáveis por estabelecer esses elos, tipo: “A serpente disse então à mulher: “Não, não morrereis! Mas Deus sabe que, no dia em que dele comerdes, vossos olhos se abrirão e vós sereis como deuses, versados no bem e no mal.” (ZAMAGNA, 2010, p. 37) e, claro, decidir por um sentido que, vale a pena insistir, está absolutamente aberto no texto hebraico-aramaico original.  Se o paralelo é válido podemos dizer que o trabalho latino e grego funciona mesmo como o sistema pré-consciente/consciente costurando o inominável da letra até apagar, ou tentar apagar, sua polifonia. Em termos bem freudianos:
Ao sistema Pcs cabe viabilizar o trânsito entre os conteúdos das idéias, de modo que elas possam comunicar-se e influenciar-se mutuamente; também é sua tarefa inserir uma ordem temporal nos conteúdos ideacionais, introduzir uma censura ou várias censuras e submeter tais conteúdos ao teste de realidade e ao princípio de realidade. (FREUD, 2006, p. 39)

Em suma, a função, seja a da Septuaginta ou seja da Vulgata, é dar sentido, barrar os outros possíveis e fixar, com todo o esforço possível, uma unicidade. Exatamente da mesma forma que o sistema Pcs/Cs procede frente a barafunda inconsciente. Utilizando de uma energia enorme, a consciência pretende dizer de forma desembaraçada aquilo que se diz nesse novelo significante que a contraria. A consciência pretende ser maestro de uma sinfonia, digamos, ao estilo dodecafônico. Mas ela, veremos várias vezes, fracassa onde, talvez, Schonberg triunfa.
Neste momento voltemos com força no aforismo de Lacan, “o inconsciente é estruturado como uma linguagem” (LACAN, 1986, p. 25) para levantarmos a lebre: que ou qual linguagem é esta senão esta que estamos a perseguir aqui e que se mostra tão bem a partir do texto bíblico hebraico?
Pois bem, é sempre tão difícil mostrar como é que opera esse sistema descoberto por Freud e eis que assim, perto da cotidianidade de uma imensa maioria de pessoas, seu ordenamento, suas leis e parte de seu processamento fica evidente e palpável. O leitor pode facilmente imajar (6) a suposta complexidade daquilo que parece antes se furtar a visão e agora, não mais obnubilado, poderá nos acompanhar em outros desdobramentos. Que fique claro, contudo, que não afirmamos em momento algum que o texto hebraico é inconsciente ou mesmo que o inconsciente escreve de forma semítica. O que quisemos, até então, foi demonstrar que aquilo que Freud descortina em nosso psiquismo encontra suas expressões em outros campos e, portanto, temos mais de uma forma de exemplificá-lo e, claro, trabalhá-lo. Há já algum tempo houve uma certa discórdia entre Lacan e alguns de seus discípulos (7) terminada na seguinte afirmação, dele: “A linguagem é a condição do inconsciente” (LACAN, 1979, p. 25). Reafirmamos aqui essa máxima ao dizermos que é porque a linguagem estabelece necessariamente exclusões de seu campo consciente que um inconsciente se produz e é nessa toada que chamamos o texto bíblico, já que quando optamos por um sentido em suas letras será um(s) outro(s) que necessariamente cairá sob recalque e não será Maimônides, com suas “interpretações alegóricas” (HADDAD, 2012, p. 65) e seu adoçamento palavreiro que apagará essa violência.

E como não pretendemos parar apenas no princípio, vamos dar um passo a mais abandonando momentaneamente aquilo que é de alguma forma domiciliar a todos nós. Teremos, nesse sentido, de deixar entrar uma outra Beatriz (8) em cena, chamada James Joyce, e que nos guiará a partir de agora pelos “desfiladeiros do significante” (LACAN, 1988, p. 86). Que o leitor não se assuste – se já o fez antes, que se recomponha –  pois o território que adentraremos a partir de agora será aquele dos interstícios da noite e as trevas tendem a dominar todo o horizonte. Falamos, é claro, da fenomenal obra do escritor irlandês chamada de Finnegans Wake. Dediquemos algumas palavras sobre ela a guisa de introdução para, depois, evocar uma vez mais o texto que nos serviu de guia até o momento e, aos poucos, vamos detalhando nosso entendimento acerca do inconsciente e enfim apontarmos a proa para o real norte desse trabalho!
AS ÁGUAS DE MARÇO, ABRIL, MAIO, JUNHO...

Os líquidos sofrem uma constante mudança de forma
       Zygmunt Bauman (9)

Depois de um dia exaustivo, Leopold Bloom chega em casa, se deita, beija as nádegas de sua esposa e começa a dormitar devaneando, como qualquer pessoa, antes de pegar no sono:
Simbá dos sete Mares e Limbá dos sete Lares e Bimbá dos sete Bares e Pimbá dos sete Pares e Gumbá das sete Gares e Dimbá dos sete Dares e Timbá dos sete Tares e Himbá dos sete Hares e Quimbá dos sete Quares e Rimbá dos sete Rares e Zimbá dos setes Zares e Jimbá dos sete Fares e Wimbá dos sete Nhares e Nimbá dos sete Yares e Ximbá dos sete Phthares (JOYCE, 2012, p. 1037)
 
E dorme, acordando Nora, já no dia 17 de Junho de 1904  e, com ela, Joyce para um mundo liberto de certas limitações. Com inacreditáveis 25 mil palavras e nenhum ponto ou vírgula, Nora se põe a falar assim:

onde eu fui uma Flor da montanha sim quando eu pus a rosa no cabelo que nem as andaluzas faziam ou será que hei de usar uma vermelha sim e como ele me beijou no pé do muro mourisco e eu pensei ora tanto faz ele quanto outro e aí pedi com os olhos para ele pedir de novo sim e aí ele me perguntou se eu sim diria sim minha flor da montanha e primeiro eu passei os braços em volta dele sim e puxei ele pra baixo pra perto de mim pra ele poder sentir os meus peitos só perfume sim e o coração dele batia que nem louco e sim eu disse sim eu quero Sim (Idem, p. 1106)

E, sem querer, ao menos não parecia ser essa a sua intenção inicial, acaba por abrir as portas para uma imensidão de possibilidades e que se chamará, depois de 17 anos, Finnegans Wake. Em Ulisses tivemos acesso às peripécias diurnas do pacato Poldy. Conhecemos seus pensamentos mais íntimos e suas taras mais secretas. Pudemos também acompanhar o arrogante Stephen Dédalus, com sua retórica empolada e seu caminhar da praia em direção ao álcool, à zona e enfim ao braço paterno de Leopold. Em Finnegans Wake é a narrativa que ficará comprometida pois o dia é desbancado pela noite e, nela, o mundo onírico vem à tona. Foi isso que Jimmy (10) pôs no papel pois

nos sonhos estamos libertos das limitações do mundo espaço-temporal. Esse mundo insiste que um evento siga o outro e que as identidades sejam distintas, de modo que A não ocupe o mesmo trecho de espaço-tempo de B; nem A se torne B. Mas um sonho permite que Jonatham Swift seja também Tristam que se apaixonou por Iseult e, a um e mesmo tempo, Parnell. (BURGESS, 1994, p. 203)

E foi isso que Joyce quis fazer, sua “imitação do estado onírico” (ELLMANN, s/d p. 883). Em conversa com Wilian Bird Joyce diz, rebatendo as críticas de, entre eles, Ezra Pound: “Eles dizem que é obscura. Naturalmente comparam-na ao Ulisses. Mas a ação do Ulisses ocorria principalmente durante o dia, e a ação do meu novo livro se desenrola à noite. É natural que as coisas não fossem tão claras à noite, não é assim?” (Idem, p. 729). E antes: “Botei a linguagem para dormir” (Idem p. 673). E, mais eloquentemente: “Escrevendo sobre a noite eu realmente não pude, senti que não podia, usar as palavras em suas ligações habituais. Usadas dessa maneira elas não expressam como são as coisas à noite” (...) E continua: “Achei que isso não pode ser feito com palavras em suas relações e conexões comuns. Quando a manhã chegar naturalmente tudo ficará claro outra vez. (...) Eu lhes devolverei sua língua inglesa. Não a estou destruindo em definitivo”. (Idem, p. 673)
Falamos em destruição da narrativa mas, como vimos, é todo o mundo desperto, todo estado de vigília e até o que supomos ser a língua que rui junto. Apresentemos, neste momento, alguns momentos desse tecido que, ao que tudo indica “não pára de se inscrever” (LACAN, 1985, p. 127). O livro começa assim:

riverrun, past Eve and Adam’s from swerve of shore to bend
of bay, brings us by a commodius vicus of recirculation back to
Howth Castle and Environs.
Sir Tristram, violer d’amores, fr’over the short sea, had passen-
core rearrived from North Armorica on this side the scraggy
isthmuss of Europe Minor to wielderfight his penisolate war: nor
had topsawyer’s rock by the stream Oconee exaggerated themselse
to Laurens County’s gorgios while they wente doublin their mumper
all the time: nor avoice from afire bellowsed mishe mishe to
tauftauf thuartpeatrick not yet, though venissoon after, had a
kidscad buttendes a bland old Isaac: not yet, though all’s fair in
vanessy, were sosie sesthers wroth with twone nathandjoe. Rot a
Peck of pa’s malt hada Jhem or Shen brewed by arclight and rory
End to the reggibrow was to be seen ringsome on the aquaface (11).
The fall (bababadalghraghtakamminarronnkonnbronntonner-
Ronntuonnthunntrovarrhounawnskawnskawntoohoohoordenenthur-
nuk!) of a once wallstrait oldparr is retaled early in bed na later
on life down trought all Christian minstrelsy. The great fall of the
offwall entaileda t such short notice the pftjschute of Finnegan,
erse solid man, that the humptyhillhead of humself prumptly sends
an unquiring one well to the West in quest of his tumptytumtoes:
and their upturnpikepointandplace is at the knock out in the park
 where oranges habe been laid to rust upon the Green since dev
linsfirst loved livvy.(JOYCE, 2012, p. 98)

Parece ininteligível, não é mesmo? Talvez uma passagem das 27 línguas (12) para, em teoria, uma só, clareie as coisas:

         riocorrente, depois de Eva e Adão, do desvio da praia à dobra
da baía, devolve-nos por um commodius vicus de recirculação devol-
ta a Howth Castle Ecercanias.
Sir Tristrão, violista d’amôres, através o mar breve, não tinha
ainda revoltado de Norte Armórica a êste lado do áspero istmo da
Europa Menor para loucomover sua guerra penisolada: nem tinham os
calhões do altom sawyerrador pelo rio Oconne sexagerado aos gorgetos
 de Laurens County enquanto êles iam dublando os bebêbados todo
o tempo: nem avoz de umachama bramugira mishe e um tau-
Tauf tuèspatruísquio: nem ainda embora logo mais veniesse, tinha
Um novelho esaùrido um velho e alquebrando Isaac: nem ainda, em-
Borá tudo seja feérico em Vanessidade, tinham as sesters de papamalte
Haviam Jhem ou Shen recevado à arcaluz e auroras antes o barcoíris
Fôra visto circularco sôbre a aquaface.
A queda (bababadalghraghtakamminarronnkonnbronntonner-
ronntuonnthunntrovarrhounawnskawnskawntoohoohoordenenthurnuk!)  de
um ex venerável negaciante é recontada cedo na cama e logo na fama
por todos os recantores da cristã idade. A grande queda do ovalto do
muro acarretou em tão pouco lapso o pftjschute de Finnegan, outrora
sólido ovarão, que humptyhaltesta dêle prumptamente manda uma
testemunha para oeste à cata de suas tumptytumtunhas: e o retrospico-
pontoeponto delas repausa em pés no parque onde oranjos mofam sôbre
o verde desde o que primoamor ao diablin levou Lívia. (CAMPOS, 1971, p. 35).

Não?! Quem sabe esta outra versão seja mais compreensível:

rolarriuanna e passa por Nossenhora d’OOhmem’s, roçando
a praia, beirando ABahia, reconduz-nos por commódios cominhos recorrentes
de Vico ao de Howth Castelo e Earredores.
Sir Tristrão, violeiro d’amôres, d’além mar encapelado, não tinha
passancorado reveniente de Norte Armórica a estas bandas do istmo escarpado da
Europa Menor para o virolento conflito de penisoldada guerra: nem
as pétreas bolotas de Sawyer ao longo do Oconee caudaloso se tinham
 seggsagerado ao território laurenciano da Geórgia enquanto se dublinavam
em mamypapypares o tempo todo: nem avoz do fogo rebellava mim-She,
mim-She ao tauftauf do pautripedríciooquetués: ainda não, embora
em invernesses fantasvale tudo, as tristes esthernes tinham dilaceradoo duuno
nathadeãojo. Barrica nenhuma de maltescocês tinham Jhem ou Shem fermentado
à luz iriada darco e a chuvosa-pestana brilhava em anel à tona d’aquaface.
A queda (bababadalghraghtakamminarronnkonnbronntonner-
Ronntuonnthunntrovarrhounawnskawnskawntoohoohoordenenthur
nuk!) dum dantanho walltreetado velhonário é recontada cedo no leito, depois
sabe viva o conceito ao longo de toda a cristã menestrelidade. A grande queda
desdeo altomuro recortou em curtolance a pftjqueda de Finneagn,
varão outrora mais q’estável, que a humptymontesta lá dele prumptamente
desvestiga quem lhe diga no Ocidente o acidente de seus tumptytum-
dedos: e seu parcoespaçoepouso é na porta do parque,
lugar de arranjos de oranges mofados sobre o verde desde que Dia-
Dublin um diamou Livvydinha.
(SCHULER, 2004, p. 03)

Ainda não? Pois bem, existem estudiosos que se debruçaram – o velho James queria “manter os críticos ocupados por trezentos anos” (ELLMANN, s/d, p. 865) – sobre esse mosaico em perpétuo movimento. Vejamos o que puderam dizer sobre esse trecho inicial. Primeiro Joseph Campbell, famoso simbologista e seu até agora insubistituível A Sketeton Key To Finnegans Wake: “The story of Finnegan, freed from the thematic entanglements of the fisrt four paragraphs” (CAMPBEL, 2005, p. 37). E continua, dizendo-nos que o estilo da narrativa é aqui, comparado a outros trechos, fácil de acompanhar. Mas quem é Finnegan, já que é sua história (será?) que aí está? Dizem, entre eles Paulo Vizioli (1991) as más línguas que ele seria inspirado em Tim Finnegan, em sua morte e seu velório. Esta historieta é cantada de forma cômica no folclore irlandês. E começa assim:

Tim Finnegan morava na rua Walker,
         Distrito Irlandes e muito curioso.
Tinha lá seus amigos, claro e agradáver,
           Pra subir no mundo carregava um cocho.
Só que Tim era chegado à bebida:
           Com amor ao beberico ao mundo Tim veio,
E pra dar uma força ao dia-a-dia
           Tomava a criatura logo cedo.

Segue um coro repleto de pantomina, hurras e vivas para continuar em:

Certa manhã Tim encheu a cara,
           Sentia a cabeça pesar, um tremório.
Foi quebrar o crânio caindo da escada,
           Pra casa o levaram, corpo pro velório.
Envolto em bonito lençol limpo,
           Na cama logo estenderam,
Pondo os pés galão de uísque,
            Barril de porter a cabeceira. (BURGESS, 1994, p. 210 e 211.)

Seus amigos ficam a velar o corpo, bebem, brigam e na confusão um deles derruba um galão de uísque sobre Tim que demonstra, ao final e para espanto de todos que, de morto, não tinha nada. E a festa continua!
O Finnegan de Joyce também cai – parece ser esse um sentido daquela enorme quantidade de letras – e também se levanta. Ainda nas palavras de Campbell: “The fisrt twnety-five pages of Joyce’s narrative deal directly with the subject of the title theme: the fall, the wake, and the portended ressurection oh the prehistoric hod carrier Fiinegan” (CAMPBELL, 2005, p. 37). Mas ele não seria apenas Timothy já que representa, também, o lendário Finn MacCool, que delineia a ilha inteira da Irlanda e que um dia se levantaria para a redenção dessa terra (13) . Mas há quem diga, entre eles o escritor de Laranja Mecânica, que pela história narrada e pelo apodo Big Master o Finnegan de Joyce teria íntima relação com o construtor Solness, de Ibsen – a quem admirava – que cai de uma torre – “Entrevê-se indistintamente por entre as árvores a queda de um corpo humano, que cai entre as vigas e tábuas” (IBSEN, 1984, p. 283) depois de juras de amor a sua amante Hilda –– “(...) só construirei uma coisa... a mais doce que há no mundo... E quero construí-la em companhia de uma princesa a quem amo” (Idem, p. 278) – e morre, definitivamente. Um bêbado, um país, um construtor, mas quem é esse tal de Finnegan, afinal de contas? E que relação tem ele com Adão e Eva? E com Tristão e Isolda? E com esse Jhem or Shen? E se ele representa a Irlanda porque se fala neste ponto com amor em América do Norte? Talvez a chave para compreender o texto não esteja aí. Talvez, se ela existe, esteja muito mais numa “série interminável de níveis que se encaixam em outros e assim sucessivamente” (AMARANTE, 2009, p. 46). Mas chamemos à discussão o corajoso tradutor do livro para o debate. O que nos diz ele sobre esse trecho do Wake e que ainda não abordamos?
Ele nos diz que há aí – e há – o filósofo Giambattista Vico e sua teoria sobre a circularidade do tempo. Que há também – e também há – uma luta entre Esaú e Jacó. Fica clara a referência ao famoso personagem Humpty Dumpty, de Alice Através do Espelho que, entre outras coisas afirma: “Quando eu uso uma palavra (...) ela significa exatamente o que quero que signifique: nem mais nem menos” (CARROLL, 2002, p. 204). E assim continua, até dedicar-se a inacreditável composição bababadalghraghtakamminarronnkonnbronntonnerronntuonnthunntrovarrhounawnskawnskawntoohoohoordenenthurnuk!
E escreve: “a primeira palavra do trovão” – há um consenso sobre isso entre os críticos e estudiosos, sobre ser um trovão – “abre com a sílaba ba, alma na mitologia egípcia” – Joyce também foi beber no Nilo para compor seu livro – “representada por uma ave de cabeça humana” (SCHULER, 2004, p. 96). Assim:   
Ba é também uma das primeiras sílabas articuladas pela criança. Do a passa-se ao colorido da consoantes nas palavras seguintes. (...) A queda, interiorizando o conflito, erotiza-se ao assinalar o início da sexualidade consciente. Entre palavras que significam trovão em outras línguas, ouve-se trovarr, nome derivado de “trovão” em português. (Idem, p. 97.)

Caro leitor, compreendeu agora? Mas convenhamos, será que isso que puderam dizer Donaldo, Anthony e Joseph é mesmo o que está no texto ou será que seus preciosos trabalhos fazem o mesmo que os intérpretes da bíblia hebraica ou seja, colocam sentido onde ele verdadeiramente insiste em escapar? Nossa ênfase lá, quando trabalhamos com parte do Antigo Testamento,  recaiu sobre as lacunas entre os significantes mas agora, com esse percurso um pouco mais longo, com alguns passos dados, pensemos em termos de tradução em seu sentido mais geral, neste que frente a um texto, sentimos a eclosão imediata da pergunta: o que isso, aí, que dizer? Veremos que a ideia infantil e tantas vezes pedagógica de que a palavra designa a coisa escorre pelo ralo com uma velocidade estonteante. Peguemos algumas delas, só para esquentar.
Primeiro a versão de Adolpho Wasserman e Chaim Szwertsszartf ao salmo 121-1, um dos salmos mais cantados na cultura judaica, conhecido como Shir la maalot ou Cântico das Ascensões ou, ainda, Cântico das Subidas que inicia assim: “Ergo meus olhos às montanhas; donde virá minha ajuda?” (SZWERTSZARTF, 1995, p. 192). Agora, recorramos a versão da King James, responsável pela passagem da latina Vulgata para o inglês em 1611 e daí para o mundo. O mesmo trecho está assim: “I WILL lift up mine eyes unto de hills, from whence cometh my help” (JAMES, 2010, p. 272.). Ambas se reportam a אֶשָּׂא עֵינַי, אֶל-הֶהָרִים-- מֵאַיִן, יָבֹא עֶזְרִי , mas o leitor terá notado que a primeira apõe uma interrogação enquanto a do rei James quase exclama a sentença e não é a mesma coisa, convenhamos, interrogar de onde virá o socorro e afirmar que ele virá das colinas onde Deus habita.
Mas isso ainda é pouco! Vejamos a confusão que se pode operar à partir de בראשית ברא אלוהים את השמים ואת הארץ והארץ הייתה ריקה וחושך מעורפל כיסה את התהום utilizando um quadro que procura traduzir o texto à partir de suas raízes e que nos foi oferecido pelo acadêmico e hebraísta Frederico Denez:

רֵאשׁ cabeça, primeiro, topo, começo, início, chefe, superior, bater, banda, capitão, capítulo, excelente, primeiro, altura, parte mais alta, sacerdote, guia, principal, lei, fel, cicuta, veneno. Derivados: dividir, pedido, permissão, necessidade, posse, propriedade.

 

Criar, moldar, formar, dar forma a, criar novas circunstâncias ou coisas, referindo-se a transformações, ser criado, algo novo, cortar, recortar, engordar.

 

Plural. Poder, poderes. Qualidade divina. Governantes, juízes, seres divinos, anjos, deuses, deus, deusa, divino, obras ou possessões divinas, Deus. (outras pronúncias advindas dos massoréticos – jurar, amaldiçoar, colocar sob juramento; em aramaico, Deus – tanto uma divindade pagã, quanto o Deus de Israel)

 

Próximo, junto a, com, de...com; aramaico – sinal, sinal milagroso, maravilhas.

 

Céus, firmamento, morada das estrelas, universo visível, morada de D’us; raiz pode conter o significado de júbilo, regozijar, estar alegre, feliz resultado, assunto prazeroso.

 

Próximo, junto a, com, de...com; aramaico – sinal, sinal milagroso, maravilhas

 

Terra, firme, contrário de céu, habitantes da terra, país, território, distrito, região, porção de terra, Israel, subterrâneo, solo, superfície, chão, espaço, distância, planície, limites. (raiz - dominar)

 

רֵאשׁ cabeça, primeiro, topo, começo, início, chefe, superior, bater, banda, capitão, capítulo, excelente, primeiro, altura, parte mais alta, sacerdote, guia, principal, lei, fel, cicuta, veneno. Derivados: dividir, pedido, permissão, necessidade, posse, propriedade.

 בְּרֵאשִׁית בָּרָּא אֱלֹהִׁים אֵת הַשָּמַיִׁם וְּאֵת הָּאָרֶץ

 

 

Terra, firme, contrário de céu, habitantes da terra, país, território, distrito, região, porção de terra, Israel, subterrâneo, solo, superfície, chão, espaço, distância, planície, limites. (raiz - dominar)

 

Raiz do verbo “existir”; הָּיְָּה ser tornar-se, vir a ser, acontecer, erguer-se, aparecer, ser instituído, estabelecido, ficar, permanecer, continuar, acompanhar, ocorrer, ser feito,

 

Preencher o vazio; também derivam desta raiz os verbos ir e vir, implicando, assim, a ideia de movimento em certa direção.

 

Escuridão, obscuro, baixo, lugar secreto, oculto, obscurecer, insignificante. Sua raiz sugere a tradução (possível) silêncio e seus derivados, bem como, no aramaico, prontidão, necessidade, necessário.

 

Altura, acima, alto, sobre, por causa de, em favor de, por, próximo. Derivados: trazer para cima, ascender, ser exaltado, jugo.

 

Face, presença, superfície, rosto, em frente, antes de, na presença de,

 

Profundidade, profundezas, abismo, oceano, aguas subterrâneas, fundura

 

Terra, firme, contrário de céu, habitantes da terra, país, território, distrito, região, porção de terra, Israel, subterrâneo, solo, superfície, chão, espaço, distância, planície, limites. (raiz - dominar)

 וְּהָּאָרֶץ הָּיְּתָּה תֹהוּ וָּבֹהוּ וְּחֹשֶךְ עַל פְּנֵי תְּהוֹם

Devastado, informe, confusão, irrealidade, vazio, nada, desolação, estar deserto, lugar de caos,

  

O que nos impediria de verter, utilizando esse quadro semântico, בראשית ברא אלוהים את השמים ואת הארץ והארץ הייתה ריקה וחושך מעורפל כיסה את התהום não no canônico “No princípio criou Deus os céus e a terra. E a terra era sem forma e vazia; e havia trevas sobre a face do abismo” (ALMEIDA, 1981, p. 03) mas em “No veneno moldou Deus em júbilo a planície habitada continuando a vaidade e preenchendo a obscura altura na presença das profundezas”? Ou “O chefe deu forma a Deus junto ao céu e próximo a terra subterrânea que viria a ser confusa com o preenchimento da obscura altura da face do oceano”?
E façamos o mesmo com o texto de Joyce perguntando-nos: a que corresponde “Jungfraud’s”? Ou “”Amain”? Ou “Adew”? Ou “Sthruck”? Seria mesmo “jungfreudiano” (SCHULLER, 2003, p. 139), “amém” (p. 165) e  “Vale! Orvalha!”? (CAMPOS, 1971, p. 66) Haroldo de Campos nem se arrisca com a quarta composição, que está na página 189 do original! Peguemos o título do livro: Finnegans – já vimos a quem ele pode representar. Não há nele “fin, fine, finn” e “egan ou again”? (BURGESS, 1994, p. 210). E Wake não acaba por dizer tanto acordar como pesadelo? Teríamos então O fim de Finn e seu início ao acordar (mos) de um pesadelo? Mas assim o nome se perde. Para manter um nome Schuller opta por Finnicius mantendo o fim e latinizando o início mas lá se vai o senhor Finnegan. Traduttore é traditore (14) não apenas na passagem de um idioma a outro mas em toda e qualquer busca de significação, já que o significante, esperamos ter demonstrado com o antigo testamento e com James Joyce, só se cola a um significado a muito custo e, quando o faz, exclui todas as outras possibilidades que estavam em si. E mais, quando as encontramos, essas polissemias em explosão, elas não indicam que, no infinito, de fato nada significam? “Entramos num encadeamento de palavras em que o sentido gradativamente empalidece” (SCHULLER, 2000, p.154) até, acrescentamos, se dissolver no ar.
Mais exemplos? Vejamos o que nos sussurra o capítulo VIII de Finnegans Wake, capítulo dedicado enfim a ALP (15) , entre outras possibilidades, Anna Livia Plurabelle:
O
tell me all about
Anna Livia! I want to hear all (16)
about Anna Livia. Well, you know Anna Livia? Yes, of course, we all know
Anna Livia. Tell me all. Tell me now. You’ll die when you hear. Well, you
know, when the old cheb went futt aan did what you know. Yes, I know, go
on. Wash quit and don’t butt me – hike! – when you bend. Or wahtever it
was they threed to make out He thried to two in the Fiendish park. He’s
an awful od reppe. Look at the shirt of him! Look at the dirt of it! He has
all my water black on me. And it steeping and stupping since this time last
wik. How many goes is it I Wonder I wash it? I know by heart the places he
like to saale, duddurty devil! Scorching my hand and starving my famine to
make his private linen public. (JOYCE, 2012, p. 196)

A tradução que nos oferece Dirce Waltrick do Amarante, depois de deixar bem claro que sua versão é uma “versão feminina” (AMARANTE, 2009, p.111) em consonância com as lavadeiras que margeiam o rio Liffey, é a seguinte:
O
Me conta tudo sobre
Anna Livia! Quero saber tudo
sobre Anna Livia. Bem, conheces Anna Livia? Claro que sim, todo mundo conhece
Anna Livia. Me conta tudo. Me conta já. Cais dura se ouvires. Bem, sabres, quando
o velho foolgado fallou e fez o que sabes. Sei, sim, anda logo. Lava aí não enroles.
Arregaça as mangas e solta a língua. E não me baitas – ei! – quando te apaixas.
Seja lá o que quer que tenha sido eles teentaram doiscifrar o que ele trestou fazer
no parque Fiendish. É um grandessíssimo velhaco. Olha a camisa dele! Olha que
suja questá! Ele deixou toda minh’água escura. E estão embebidas, emergidas
tolduma ceumana. Quanto tanto já lavei isso? Sei décor os lugares que ele gosta
de manchar, suujeito suujo. Esfolando minha mão e esfomeando minha fome pra
lavar a roupa suja em púlpito. (Idem, p. 115)

Mas, o que nos impediria de apresentar esse trecho da maneira que se segue já que, como escreve Haroldo de Campos;

Traduzir James Joyce (...) é uma ginástica com a palavra. (...) Algo nunca assume o aparato estático e definitivo, mas que permanece em movimento, tentativa aberta e constante, trazendo sempre em gestação novas soluções, “pistas” novas, que imantam o tradutor, obrigando-o a um retorno periódico ao texto e seus labirintos. (CAMPOS, 1971, p. 21)

O
me conte tudo sobre
Anna Livia! Eu quero ouvir tudo
sobre Anna Livia. Bem, você sabe sobre Anna Livia? Sim, claro, todos nós
sabemos Anna Livia. Conte-me tudo. Me diga já. Você vai morrer quando
você ouvir. Bem, você sabe, quando o velho Cheb foi trep e fez o que você
ouviu. Sim, eu sei, continue. Lave a roupa e saia sem nos sujar. Dobre as
 mangas se perca nesta fita. E não se abunde em mim – aaaiii! – quando
 você se dobrar. Ou  tantágua trêstaram fazer para fora dele o que a dois
tentaram no parque Fudêncio. Se trata de um horrível réptil
Olhe para a camisa dele! Olhe para a poeira nela! Ele fez toda a minha
água  preta em mim. E macera e mete desde essa sétpoca passada
A quantas vai é que eu quero saber seeu lavá-lo? Eu sei de coração os
lugares que ele gostaria de veender-se, diabo de carasujo! Escaldo minha
mão e passo fome desta outra em fazer do seu público a linha do privado (17) .

Absolutamente nada, não é mesmo?
Portanto, os textos base que usamos até o presente momento, demonstram não tanto o algoritmo saussureano, invertido (18) por Lacan em A Instância da Letra, S/s (a ser lido significante sobre significado) mas um infinito de SSSSSSSSSSSS.... (significanteSSSSSSSS) que, às vezes e por nosso esforço, se coagulam num s (significado). E isso é absolutamente freudiano quando ele faz suas considerações em, por exemplo, 1915, dizendo-nos que no inconsciente a lei que impera é a do processo primário – “mobilidade das cargas de investimento” (FREUD, 2006,  p. 38)  – enquanto no sistema seguinte a ordem é a da colabação, da junção, do agregamento.
Uma vez mais: tanto o texto hebraico quanto o de Finnegans Wake, com suas lacunas, suas não conexões lineares e sua multiplicidade de sentidos evocam o funcionamento ponto a ponto de nosso inconsciente. Para sermos mais objetivos: o inconsciente nada mais é que puro ciframento, pura consequência da linguagem e que, à vezes por proximidade e outras por causalidade produz conexões e, seguindo a letra freudiana, pedem passagem (19). Mas como para a consciência resultam incoerentes e insuportáveis, ela lhes impõe uma ordem – “esse gênero de restrições só se instala à partir do trabalho de censura” e de cesura “que ocorre entre o Ics e o Pcs”. (Idem, p. 37). E os poetas, no sentido daqueles que fazem, podem nos demonstrar isso de forma brilhante. Freud estava absolutamente certo ao escrever que 

Os escritores (...) costumam conhecer toda uma vasta gama de coisas entre o céu e a terra com as quais a nossa filosofia ainda não nos deixou sonhar. Estão bem adiante de nós, gente comum, no conhecimento da mente, já que se nutrem em fontes que ainda não tornamos acessíveis à ciência (FREUD, 1987, p. 18)

Pois bem, são eles, mesmo, que abrem a porta para aquilo que a tanto custo tentamos teorizar. Desde o Pentateuco essas fontes estão a nossa disposição bastando lê-las como convém. Devemos seguir o conselho de Joyce: “Here Comes Everybody” , não “homem comum enfim” (BURGESS, 1994, p. 224) nem o Homem a Caminho Está (SCHULLER, ) mas algo como que todos venham aí a participar já que esse é o nosso funcionamento que a muito custo procuramos esconder. Eis o que os sonhos, a bíblia e a literatura podem nos fazer ver!

REFERÊNCIAS

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NOTAS


(1) A referência aí é a história dos filhos de Hipodamia, Atreu e Tieste, que cheios de ardis para com os outros e entre si apresentam a “vendetta como lei fundamental” (MÉNARD, 1991, p. 149)

(2) Em início era o inconsciente.

(3) Esse trecho está no poema Teogonia, de Hesíodo, p. 111.

(4) Em seu discurso a Sociedade dos B’Nai B’rith, em 1926,  Freud enfatizará aspecto semelhante: “Por ser judeu encontrei-me livre de muitos dos preconceitos que restringiam outros no uso de seu intelecto, e como Judeu estava preparado para aliar-me a Oposição e passar sem consenso à ’maioria compacta ’”. (FREUD, 1987, p. 316). E claro que se pode ler aí, assim como acima, a idéia de raça e mesmo a idéia de povo escolhido, como parece ser a vertente interpretativa de, por exemplo, Renato Mezan em seu Psicanálise, Judaísmo: Ressonâncias, p. 45. Mas nada impede que nos afastemos dessa tradição ao propormos uma outra forma de leitura a que o leitor terá acesso nas páginas seguintes.

(5) É assim que Freud se refere aos sonhos valendo o lembrete real aí significa  “via ampla, larga, pela qual o rei passava, fazia seus desfiles. É a via mais reta, a menos impedida” (SAFOUAN, 1987, p. 11)

(6) “Aqui, no dia 24 de julho de 1895, o segredo do sonho se revelou ao Dr. Sigm. Freud” (FREUD, 1986,  p. 418), sonhava Freud, em carta a Willhelm Fliess em 12 de Junho de 1900.

(7) Imagée, em francês, que desde o Seminário de M. D. Magno, Senso Contra Censo: Da Obra de Arte, foi traduzido para o português como imajar. Escreve ele em nota: “Dizemos imajar, forçando um verbo, para diferenciar a construção de imagem (imajar) da atividade imaginativa (imaginar)” (MAGNO, 1977, p. 57). Assim aparecerá em Os Escritos Técnicos de Freud e nOs Quatro Conceitos Fundamentais da Psicanálise.

(8) Jean Laplanche e Serge Leclaire, no VI Colóquio de Bonneval, apresentaram um trabalho intitulado O Inconsciente: Um Estado Psicanalítico e afirmaram que “O Inconsciente é a condição da linguagem” (EY, 1969, p. 136)

(9) Beatriz foi o grande amor de Dante Aligheri que, se na vida tornou-se impossível, na morte, ou quase, lhe conduz ao céu.  No inferno e no purgatório seu guia é outro, o peta Virgílio.

(10) Retirado de A Modernidade Líquida, p. 07.

(11) Forma como James Joyce era, por vezes, chamado entre os seus. Seu pai, também à vezes, o chamava de “Jim Solar” (ROSE, 2014, p. 17)

(12) O texto não está devidamente justificado porque, como no excerto da Bíblia hebraica, fomos fiéis a estrutura original.

(13) Os críticos da obra de Joyce afirmam que eles escreveu Finnegans Wake em 27 línguas.

(14) Mas se se levanta, sendo toda a ilha, automaticamente não a destruiria?

(15) Na ordem correta: “traditore, traduttores” (CAMPOS, 1971, p. 127).

(16) Evocaremos, daqui a pouco, HCE,  “Here Comes Everybody”, iniciais de um nome sempre mutável e que rasga todo o texto com suas variantes, tipo  “Howth Castle and Environs” (JOYCE,p. 03),  “Howke Cotchame Eyes” (p. 106) e “H2CE3” (p. 95). O mesmo acontece com ALP, que ora é “annie lawrie promises” (p. 38) ora “ALPlappin” (p. 57).

(17) O texto tem essa diagramação no original.

(18) Tradução feita pelo autor desse trabalho.

(19) Invertido porque em Saussure temos, numa relação biunívoca, significado  sobre o significante. Lacan opta por dar primazia ao significante até, com o passar do tempo, romper com essa estruturação onde esses dois elementos estariam “intimamente unidos e um reclama (ria) o outro” (SAUSSURE, 1972,  p. 80)

(20) É o que depreende do famoso esquema do telescópio que Freud lança na Interpretação dos Sonhos.

 

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Revista de Psicoanálisis y Cultura
Número 29 - Febrero 2016
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